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BOLETIM CLÍNICO - número 5 - março/1999

Boletim Clínico | Psicologia Revista | Artigos

Bibliografia

ALTHUON, B. e outros. - Reunião de Pais - Sofrimento ou Prazer - 2a.Ed. - S. Paulo, Casa do Psicólogo, 1996.
ANDERSEN, Tom.- EI Equipo Reflexivo - Dialogos y dialogos sobre los dialogos - Barcelona, Gedisa, 1994.
BOCK, Ana Maria e outros. - Psicologias .- 8a.Ed. - S. Paulo, Saraiva, 1995.
CARVALHO, M. do Carmo B. - A Família Contemporânea em Debate. S. Paulo, EDUC, 1995.
DIAS, Maria Luíza. - 0 que é Terapia de Família - Col. los Passos - S. Paulo, Brasiliense, 1991.
GRINBERG, Dario e outros. - Introdução às idéias de Bion - Trad. Themira O. Brito. R. de Janeiro, Imago, 1973.
GINOTT, H. - Pais e Filhos. 4a. Ed. S. Paulo, Bloch, 1972.
JERUSALINSKY, A. e outros. Psicanálise e desenvolvimento infantil - Um enfoque interdisciplinar - Porto Alegre, Artes Médicas, l989.
KALINA, E., Laufer, H. Aos pais de adolescentes. Cobra Norato, 1974.
KNOBEL, Perestrello. A Adolescência e a Família Atual - S. Paulo, Atheneu, 1981.
LEVISKI, D. Adolescência e violência. Porto Alegre, Artes Médicas, 1997.
RAMOS, M. Introdução à Terapia Familiar. S. Paulo, Ática, 1990.
RAPPAPORT, C. e outros. Psicologia do Desenvolvimento. 4º vol. S. Paulo, EPU, 1981.
SETTON, L. de S. A. - Pensando a Inibição Intelectual. S. Paulo, Casa do Psicólogo, 1995.
SEVERINO, A. J. - Subsídios para uma reflexão sobre novos caminhos da interdisciplinaridade in Serviço Social e Interdisciplinaridade. S. Paulo, Cortez, 1989.
SOIFER, R. Psicodinamismos da família com crianças. S. Paulo, Vozes, 1982.
SZYMANSKI, H. Trabalhando com Famílias. S. Paulo, CBIA e IEE (PUCSP), 1992.


4. Avaliação do Projeto de Trabalho com Grupo de Pais

O trabalho da equipe
Realizamos neste primeiro semestre de 1997, além dos grupos de Recepção, 2 grupos de pais, conforme projeto acima apresentado, com cerca de 10 integrantes cada.

O projeto previa a realização de 4 (quatro) reuniões quinzenais, que acabaram se estendo para 6 (seis) encontros num grupo e 5 (cinco) encontros no outro, pela necessidade sentida por técnicos e clientes, de aprofundamento de alguns assuntos específicos, como sexualidade, limites, aprendizagem, entre outros. Um maior número de encontros possibilitou a criação de vínculo entre as pessoas do grupo e com a equipe interdisciplinar, facilitando o surgimento de questões novas.

As reuniões dos dois grupos seguiram dinâmicas diferentes, de acordo com os recursos técnicos de seus coordenadores.

Nos dois grupos, foram utilizados vídeos sobre concepções e situações familiares, como ponto de partida para a discussão da temática. Em ambos, preocupamo-nos em escutar, observar atenciosamente e receber o impacto dos relatos, proporcionando às pessoas uma experiência em que suas dúvidas e ansiedades fossem compartilhadas e esclarecidas.

Um dos grupos utilizou somente a conversação, às vezes estimulada por perguntas "provocativas", que facilitassem a narrativa das pessoas: - como era, no seu tempo, a relação dos pais com os filhos?" - "Como era o seu lazer?" - "Você sabe como seus pais escolheram o seu nome?" - "Como vocês escolheram o nome de seus filhos?" - "Na idade que seu filho tem hoje, como era você na escola?" - "Como se discutiam as questões de sexo?", etc.

O outro grupo utilizou-se de jogos e técnicas ativas, além da comunicação verbal, com fundamentação psicodramática (V. relato de uma reunião, dos dois grupos, em anexo).

Os dois grupos tiveram presentes as equipes reflexivas, desenvolvendo o tipo de atividade que já descrevemos. Confirmou-se a validade dessa presença nas reuniões, no sentido de favorecer o acolhimento aos pais, pela coesão das equipes de trabalho, e pelo "modelo" de abertura de diálogos e de aproximação pessoal, sem medo de assuntos mais complexos, sem recriminações, sem conduta moralizante de julgar o que é certo ou errado, na busca conjunta de alternativas a situações de bloqueio e de sofrimento.

As equipes de coordenadores e reflexivas de cada grupo reuniram-se semanalmente para preparação conjunta dos temas e da dinâmica das reuniões. Avaliamos que essa é a estratégia fundamental da ação interdisciplinar. Assim, como preconizam certos autores estudiosos dessa questão, como veremos adiante, a interdisciplinaridade ocorre fundamentalmente nas relações pessoais entre profissionais, em que as representações de cada um acerca do trabalho podem ser confrontadas, acrescidas, modificadas.

Pudemos experimentar esse tipo inesgotável e prazeroso de intercâmbio, difícil de ser transposto para o papel em toda sua profundidade. O certo é que, quando não foi possível esse intercâmbio, os membros das equipes ressentiram-se imediatamente, confirmando a necessidade de uma equipe coesa para o desenvolvimento de um trabalho integrado. Quando falamos em integração, coesão, entendemos não um nivelamento de afetos, nem do pensar e do modo de fazer, mas a superação de barreiras pessoais que bloqueiam o crescimento individual e a aceitação das diferenças, que enriquecem o conteúdo das nossas experiências.

A seqüência de temas básicos proposta no projeto mostrou-se satisfatória, servindo apenas como um eixo condutor das discussões, aberto a modificações ou especificações de outros assuntos coligados.

A bibliografia utilizada vem atendendo à preparação da equipe. Sentimos necessidade de dedicar mais tempo ao aprofundamento teórico por parte dos estagiários e a um intercâmbio mais demorado entre os profissionais e toda a equipe.

A participação dos pais
Foi visível a evolução dos pais do primeiro ao último encontro, tanto na discussão dos temas como na abertura pessoal ao próprio grupo. Percebemos mudanças nas suas representações em relação à Clínica e a sua proposta de trabalho.

Em geral, os pais aproximam-se da Clínica depositando nela toda a responsabilidade pela "cura" de seus filhos. Ao mesmo tempo, esperam ser acusados ou criticados como culpados pelos problemas, ainda mais aqueles que internalizaram seus próprios pais como pessoas muito críticas. A maioria deles chegam muito sofridos, preocupados com o futuro de seus filhos, sofrendo perdas, não aceitando as diferenças individuais, acentuando o negativo, na visão de mundo.

Mostram-se sem parâmetros em relação à questão dos limites, talvez como expressão de uma geração, à qual todos pertencemos, herdeira de uma pedagogia liberal e permissiva não eficiente. Pesquisas nesse sentido apontam que grande parte dos jovens de hoje apresentam auto-estima muito inferior à média e que os pais estão inseguros e temerosos em relação aos filhos (Haim Omer). Esse autor acentua a necessidade de se implementar junto aos pais a "presença parental", acrescentando ao afeto o calor e a firmeza, restituindo a presença dos pais na vida de seus filhos e recuperando sua individualidade e sua capacidade de agir.

Pudemos sentir esse receio dos pais em relação aos filhos e a insegurança no trato dos limites, muitas vezes como expressão da própria fragilidade e da própria dificuldade em lidar com frustrações.

Num dos grupos, com reuniões à tarde, houve a presença só de mulheres. Observamos a ausência do elemento masculino não só fisicamente. Pelo relato das mães, os pais, na grande maioria, estavam ausentes no enfrentamento das questões relativas ao desenvolvimento de seus filhos, chegando, às vezes, a negar a existência de problemas. Alguns dos motivos que levariam as mães a se responsabilizarem mais por essa tarefa "educativa" de seus filhos foram levantados nos grupo e a equipe formulou algumas hipóteses a respeito: não acreditamos que o horário das reuniões (à tarde) fosse o único impedimento a uma maior participação dos homens.

Na nossa cultura, há ainda a mentalidade de que a mulher é a responsável pela educação e formação das crianças, como uma extensão das suas tarefas domésticas, cabendo ao homem ser o provedor material da família. Apesar de mudanças radicais no cotidiano das famílias, em que a mulher, com seu trabalho, faz parceria nessa função de prover, permanece ainda a dificuldade dessa parceria estender-se a todas as outras funções parentais.

Nas falas das mulheres do grupo, pudemos perceber que os homens se atemorizam com a árdua tarefa de compartilhar as diferenças e arcar com alguma responsabilidade nos desajustes de seus filhos; e esse aspecto é muitas vezes reforçado por atitudes inconscientes de suas companheiras que, ao mesmo tempo, se queixam da não participação dos maridos, tomam atitudes concretas de deixá-los "de fora" dessa questão, não permitindo que atravessem essa "área perigosa".

Outro dado interessante nesse grupo de mães é que o tema da sexualidade veio sendo insinuado no decorrer das reuniões e só aflorou, explicitamente, no últimos encontro, trazendo dificuldade sérias dessas mães, como por exemplo, receio de "tendências" homossexuais do filho e limites na relação afetiva e gestos de carinho entre pai e filha. Evidenciou-se o quanto ainda há de repressão no lidar com esta questão. Parece que é bastante fácil tratar dela em tese, mas há muito receio de aprofundá-la, relacionando-a com as situações mais concretas. Ao mesmo tempo, quando há tempo, espaço e acolhimento, elas se explicitam e podem ser cuidadas.

Os dois grupos evidenciaram que, muitas vezes, os pais projetam nos filhos suas dificuldades, ainda sem condições de serem deslindadas. Nesses casos, "os filhos problemas", em geral os mais sensíveis, colocam-se como depositários, alvos de dificuldades parentais. A ansiedade das crianças e seus comportamentos podem reativar nos pais as próprias vivências nos momentos evolutivos em que seus filhos se encontram agora. Ao mesmo tempo, essas crianças constituem-se em lembretes e desafios aos pais, servindo-lhes como estímulo para lidar com suas próprias "insuficiências".

Consideramos importante oferecer aos pais uma oportunidade de começar a entrar em contato com seus sentimentos e reações e dar-lhes indícios de que são capazes de pensar sobre eles. A função dos grupos de pais é iniciá-los na longa e penosa descoberta que valoriza o lidar com a realidade e a convicção de que essa atitude pode provocar o crescimento, a transformação, a mudança.

Sensibilizamos os pais a tentar entender o significado dos sintomas que seus filhos apresentam, descentralizando seu enfoque da "criança problema", ampliando para a percepção das interações na família e na relação desta com o contexto sócio-cultural. Nesse sentido, vimos como os grupos sociais das nossas relações cotidiana (os familiares, a escola, o grupo de amigos, o grupo religioso,...) acabam, muitas vezes, por reproduzir a mentalidade discriminatória e preconceituosa ainda predominante na nossa cultura, reforçando ou mesmo criando sintomas e problemas.

Os participantes dos dois grupos avaliaram as reuniões como muito proveitosas e "agradáveis". As frases do tipos "saímos mais calmos", "aprendemos muito", "pena que acabou", "outras pessoas deveriam também estar aqui", são freqüentes. O sofrimento e o choro, surgido por vezes, foi valorizado ao final das reuniões, com agradecimentos comovidos. Várias vezes os pais referiram algumas mudanças operadas na relação familiar, principalmente de maior aceitação das diferenças e dos próprios problemas a serem encarados.

Uma das mães, com freqüência, iniciava a reunião dizendo da sua necessidade de "sair mais cedo", por algum tipo de compromisso. E, sem exceção, permanecia até o final. Parecia desejar proteger-se, de início, contra algo muito forte, poderosos e ameaçador. Aos poucos, no decorrer das reuniões, ia se tranqüilizando.

Perguntamo-nos o que teria ocasionado o alívio e a sensação de valorização a que muitos pais, de ambos os grupos se referiram. Entre outros elementos, concluímos que foi o contexto de respeito, de escuta e de curiosidade que conseguimos criar. As pessoas são legitimadas à medida que ouvem e podem perguntar, com atenção, sobre a sua história e a história dos outros, sem medos e sem recriminações.

Texto extraído do Relatório Final de Pesquisa Interdisciplinar – PUC/SP 1996
Em 1998, a equipe constituiu-se, além das professoras-autoras, dos seguintes profissionais e estagiários de Serviço Social e Psicologia: professoras Maristela Gasbarro e Rosalina Santa Cruz e dos estagiários: Alessandra Medeiros, Cirlei Célia Gomes, Daniela Santos Reis, Flávia Sulino dos Santos, Marcelo M. Gianini, Mário S. Iyama, Rita de Cássia França, Sandra Helena da Silva, Solange Monteiro Amador e Teresinha Rocha de Macedo.

Notas:
(1) Graduada em Sociologia, com Especialização em Psicologia Clínica em Psicoterapia de Casal e Família e Professora Assistente do Departamento de Psicodinâmica da Faculdade de Psicologia da PUC-SP.
(2) Mestrado em Serviço Social e Especialização em Curso Avançado de Família.