aprimoramento - topo banner - clínica psicológica - puc-sp

BOLETIM CLÍNICO - número 6 - agosto/1999

Boletim Clínico | Psicologia Revista | Artigos

5. Influência da aprendizagem pré-primária, sobre o grau de maturidade e prontidão para alfabetização (1) - Ana Maria Poppovic (2)

Este artigo foi publicado, inicialmente, na Revista de Psicologia Normal e Patológica, nº 3 e 4, Ano X, jul-dez/64, e está sendo reimpresso por dois motivos: por ser uma contribuição que mantém atualidade e como homenagem à Profª Ana Maria Poppovic.

Em nosso país oficialmente uma criança começa seus estudos aos 7 anos de idade, iniciando nesta época a alfabetizar-se.

Aumenta no entanto, cada vez mais, o hábito de colocar a criança em cursos preparatórios ao primário. São os chamados cursos pré-primários.

Sabemos que uma criança de 7 anos, para que seja bem sucedida no processo de alfabetização, deve apresentar algumas características mínimas como:

- Inteligência normal.

- Razoável estado de saúde física.

- Razoáveis condições de equilíbrio e maturidade afetiva.

- Maturidade das funções gerais e específicas necessárias à alfabetização.

A finalidade dêste estudo é verificar a influência do treinamento dado pelo curso pré-primário, sôbre a última destas características.

Consideramos como funções específicas necessárias à alfabetização, a percepção visual e percepção viso-motora, a coordenação auditivo motora e a coordenação motora, a memória e a atenção. Além disto deve existir uma capacidade geral que tenha permitido a aquisição de um mínimo de conhecimentos gerais relativos a vocabulário, números, quantidades e noções de coisas. A capacidade de trabalhar em conjunto e receber e executar ordens coletivamente deve estar suficiente desenvolvida.

Escolhemos para a verificação dêstes aspectos os seguintes testes: A B C de Lourenço Filho, Teste Metropolitano de Prontidão de HILDRETH e GRIFFITHS(3) e o Desenho da Figura Humana de GOODENOUGH.

Os dois primeiros pretendem medir exatamente as funções acima citadas, sendo um de Maturidade para a aprendizagem da leitura e escrita e o outro de Prontidão para alfabetização. O teste de Goodenough foi incluído por apresentar características gráficas que interessavam ao estudo, bem como para verificar a independência entre a aprendizagem da tarefa proposta e a medida de inteligência possibilitada pelo teste.

PROCEDIMENTO
O trabalho foi realizado com as 136 crianças que se inscreveram no 1º grau primário do Grupo Escolar Experimental Drº Edmundo Carvalho, situado no bairro da Lapa, na cidade de São Paulo. O nível sócio-econômico das crianças que frequentam esta escola é médio e médio-inferior. A escola possue curso pré-primário, e a direção bem como o corpo docente preocupam-se por mantê-lo atualizado dentro de boas normas pedagógicas.

Foram aplicados os 3 testes citados em tôdas as crianças que passariam a freqüentar o 1º grau primário e para avaliação da inteligência foi aplicado também o Teste das Matrizes Progressivas de Raven, Escala Especial.

Foi escolhida esta prova por ser uma medida de Fator G, a menos influenciável no caso, pelo fator que desejávamos verificar: a aprendizagem dada pelo curso pré-primário.

Uma vez aplicadas as 4 provas, separamos do grupo total, aquelas crianças que não possuiam escolaridade alguma, ou seja, o grupo que nunca havia freqüentado curso pré-primário.

Emparelhamos cada uma destas crianças com uma das crianças que haviam freqüentado no ano anterior o curso pré-primário do Grupo Escolar Experimental. Os critérios usados para o emparelhamento foram a Idade Cronológica e o Nível Mental determinado pelo teste de Raven.

Formamos assim 2 grupos de 27 crianças cada um, cuja idade média era 7 anos e 3 meses, variando de 7 a 8 anos, e cujo Decil Médio de Inteligência era 5,4 variando de 1 a 10.

Estabelecendo-se o nível de significância de 1%, foram comparadas as médias dos dois grupos quanto aos resultados apresentados nos testes A B C, Metropolitano e Goodenough.

RESULTADO

TESTES "t"
Metropolitano 12,70*
A B C 12,44*
Goodenough 21,93*
 *Diferença significativa a nível de 1%


Os resultados obtidos levam à rejeição da hipótese da diferença nula, fazendo supor que os grupos não são iguais havendo diferenças, nos 3 testes, a favor daquele que teve aprendizagem pré-primária.

A fim de saber se o grupo de crianças com pré-primário, escolhido para o emparelhamento, representava quanto ao aspecto intelectual, o grupo total de crianças inscritas no 1º ano, procedemos ao cálculo das diferenças significativas entre as médias, usando o "t" de Student com nível de significância de 5%. Pela necessidade de emparelhamento a partir do grupo sem pré-primário, poderia ter sido escolhido do grupo total, um subgrupo de crianças portadoras de nível intelectual mais alto ou mais baixo, cujas características difeririam do grupo total inscrito no 1º ano.

  Raven "t"
Crianças com pré-primário
(N = 109)
X = 6,07
s = 2,85
0,41*
Crianças sem primário
(N = 27)
X = 5,77
s = 2,54
 * diferença não significa o nível de 5%


Os resultados demonstram que não há base para rejeitar a hipótese nula, isto é, no que tange à inteligência o grupo de crianças sem pré-primário pode ser equiparado ao grupo total de crianças que freqüentaram o pré-primário.

CONCLUSÕES
Considerando que o grupo de crianças sem pré-primário pertence à mesma população do ponto de vista de nível intelectual, que o grupo de crianças com pré-primário, pode-se concluir, pelas diferenças significativas apresentadas nos resultados dos testes, que a aprendizagem pré-primária influe de maneira eficiente na maturação das funções gerais e específicas necessárias à alfabetização, como descritas anteriormente.

A acentuação grande da diferença significativa no teste de Goodenough a favor do grupo pré-primário, em relação aos outros dois testes, leva a seguinte suposição:

A tarefa exigida pelo teste de Goodenough, além de ser gráfica, e conseqüentemente influenciada pelo treinamento geral adquirido no pré-primário, parece ser influenciada também pelo aprendizado específico do Desenho da Figura Humana.

Em outras palavras, a criança de curso pré-primário é solicitada constantemente a desenhar, e entre seus desenhos, o desenho da figura humana seria freqüente, levando-a a um aprendizado específico dessa tarefa.

Este raciocínio implica na necessidade de reservas no uso do teste de Goodnough como medida de inteligência, quando se lida com crianças dessa idade, que podem ou não ter tido treino nesse sentido.

RESUMO
A autora mostra que o treinamento dado pelo curso pré-primário influencia a maturidade das funções gerais e específicas necessárias à alfabetização.

São comparados os resultados dos testes A B C, Metropolitano de Prontidão e Goodenough, de 2 grupos de crianças emparelhadas quanto à idade e nível mental.

O grupo de crianças com pré-primário obtém resultados significativamente superiores aos das crianças sem o curso pré-primário.

A autora tece comentários sôbre a possível influência dá transferência de aprendizagem no teste de Goodenough.

RESUMÉ
L'INFLUENCE DE L'ENTREINEMENT PRÉPRIMAIRE SUR LE DEGRÉ

DE MATURITÉ POUR L'APPRENTISSAGE DE LA LECTURE

L'auteur montre comme l'entreinement donné par le cours préprimaire a de l'influence sur la maturité des fonctions spécifiques nécessaires a l'alphabetization.

Les resultats des tests A.B.C., "Metropolitano de Prontidão" e Goodenough, sont comparés entre deux groupes d'enfants du même age et niveau mental.

Le groupe d'enfants avec l'instruction préprimaire a obtenu des resultats significativement superieurs aux enfants sans cours préprimaire.

L'auteur fait des comentaires sur la possible influence de transference de l'apprentissage dans le test de Goodenough.

SUMMARY
INFLUENCE OF KINDERGARDEN TRAINING ON

READINESS FOR READING AND WRITING

The author shows that kindergarden training has an influence on maturity of specific functions necessary to the learning of reading and writing.

The results of A.B.C., Metropolitan Readiness and Goodenough tests given lo two groups of children, matched as lo age and intelligence, are compared.

Results obtained by children with kindergarden training are significantly superior to those who have none.

The author comments on the possible influence of kindergarden training on Goodenough results, jeopardizing its validity as a measure of intelligence.

BIBLIOGRAFIA
1 - GALIFRET GRANJON N. - "Étude critique des principes psychologiques sous-jacents à quelques méthodes d'apprentissage de la lecture". La Psychiatrie de l'enfant - Vol. I. Fasc. 2, 1958, 379-436.

2 - GOODENOUGH, F. L - "Test de Inteligência Infantil". Ed. Paidos Bs. As. 1957.

3 - KARLIN, R. - "The predition of reading success and reading readiness tests". Elem. Engl., 1958, 23, 187-200.

4 - LETON, D. A. - "A factor analysis of readiness tests" - Perc. Mot. Skills, 1963, 16, 915-919.

5 - LOURENÇO FILHO, M. B. - "Testes A B C para a verificação da maturidade necessária à aprendizagem da leitura e da escrita". Ed. Melhoramentos, São Paulo, 1957.

6 - METROPOLITAN READINESS TEST - World Book. 7 - TEST DE MATRICES PROGRESSIVAS DE RAVEN - ESCALA ESPECIAL. Ed. Paidos - Bs. As. 1957.

8 - VERNON M. D. - "Backwardness in Reading". Cambridge University Press - 1958.

Notas:

(1) Trabalho realizado com o auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

(2) Psicóloga Clínica - Diretora do Departamento de Psicologia Aplicada do Instituto de Psicologia da PUCSP (Profº Drº Enzo Azzi).

(3) Adaptado e traduzido pela autora para o português. Sua validação está em estudos atualmente.