RAÍZES DO CÁLCULO NA GRÉCIA ANTIGA
Um breve relato do desenvolvimento conceitual do Cálculo Diferencial e
Integral na Grécia Antiga: pois nos é importante para lembrar dos
infinitésimos de Demócrito, os paradoxos de Zeno, o método de exaustão
de Eudoxo e o cálculo da área sob a parábola por Arquimedes. O Cálculo
teve sua origem nas dificuldades encontradas pelos antigos matemáticos
gregos na sua tentativa de expressar suas idéias intuitivas sobre as
razões ou proporções de segmentos de retas, que vagamente reconheciam
como contínuas, em termos de números, que consideravam discretos.
Iremos encontrar a origem das idéias fundamentais do Cálculo
Diferencial e Integral na história da Matemática grega. Segundo a
História, os gregos possuíam, já na época em que Euclides escrevia "Os
Elementos", quase todos os fundamentos para desenvolver o Cálculo, mas
ficaram presos por algumas concepções restritivas. Foram os gregos os
primeiros a procurar a compreensão dos fenômenos ligados ao infinito,
ao contínuo, ao infinitésimo, em busca de uma explicação para o
movimento e as transformações dos seres. Da idéia de movimento virão os
primeiros conceitos do Cálculo Diferencial e Integral.
Após a crise dos incomensuráveis, que pode ser situada no seio da
nascente escola pitagórica, irá surgir outra grande polêmica muito
fértil entre os filósofos pré-socráticos. Ao que tudo indica, o
problema da incomensurabilidade entre magnitudes gerou algumas
concepções polêmicas acerca da natureza do mundo físico, como a
doutrina atomística, defendida por Demócrito, que propunha a existência
do infinitamente pequeno compondo o ser das coisas.
Demócrito, no século quinto a.C., foi o primeiro matemático grego a
determinar o volume da pirâmide e do cone. Apesar de os egípcios já
saberem encontrar o volume da pirâmide de base quadrada, o mérito de
Demócrito está em ter generalizado, bem ao estilo grego, a maneira de
determinar o volume para pirâmides de base poligonal qualquer. Para
obter o volume do cone, bastava uma inferência natural obtida pelo
aumento, repetido indefinidamente, do número de lados do polígono
regular formando a base da pirâmide. Foi, assim, o primeiro a falar de
infinitesimais, pensando em utilizar lâminas circulares infinitamente
finas para calcular o volume de cilindros e cones, antecipando-se assim
ao teorema de Cavalieri, nesses casos. A teoria dos infinitesimais de
Demócrito e seus seguidores foi combatida duramente por outra escola
filosófica, nascida em Eléa (Magna Grécia), pelo influxo das idéias de
Parmênides. A doutrina eleática chamava a atenção para os paradoxos e
contradições existentes na concepção do mundo físico como composto por
partículas infinitamente pequenas e indivisíveis. Propunha, em
substituição, considerar a imutabilidade e unidade essencial do mundo
físico. Um aluno de Parmênides, Zeno de Eléa, entrará para a História
com seus famoso dons dialéticos. Zeno dizia que a idéia de
infinitésimos é totalmente absurda, pois se possuem algum comprimento,
então uma quantidade infinita deles irá compor uma reta de comprimento
infinito; e se não têm nenhum comprimento, então uma quantidade
infinita deles tampouco terá comprimento algum. Além disso, dirá
também: aquilo que acrescentado a outro não o faz maior, e subtraído de
outro não o faz menor, é simplesmente nada.
Mais famosos ainda que esses argumentos são seus quatro paradoxos sobre
a impossibilidade do movimento. A questão por trás dos paradoxos está
em se considerar tempo contínuo e espaço discreto, ou vice versa. Os
paradoxos de Zeno recolhem a sensação de certo desamparo intuitivo,
pois relatam uma situação de perplexidade comum frente à continuidade e
ao infinito. Por exemplo, no caso do Paradoxo da Dicotomia, Zeno nos
coloca frente à aparente impossibilidade de percorrermos um número
infinito de distâncias num tempo finito. No Paradoxo da Flecha, Zeno
vai contra a noção de espaço e tempo constituído por partes
indivisíveis. Os paradoxos de Zeno ilustram a perplexidade da mente
ante os fenômenos do movimento e da velocidade, trazendo à tona
controvérsias intrínsecas que, em geral, tendem a passar despercebidas.
Como conseqüência da perplexidade ante esses fenômenos, os gregos
desenvolveram o que se chamou de Horror ao Infinito, que na Matemática
teve conseqüências muito importantes. Segundo Boyer, a Matemática
adquiriu outra configuração após Zeno: As grandezas não são associadas
a números ou pedras, mas a segmentos de reta. Em Os Elementos os
próprios inteiros são representados por segmentos. O reino dos números
continuava a ser discreto, mas o mundo das grandezas contínuas (e esse
continha a maior parte da Matemática pré-helênica e pitagórica) era
algo à parte dos números e devia ser tratado por métodos geométricos.
De início, a atitude se concretizou numa separação quase completa entre
a Teoria dos Números e a Geometria. Pode-se dizer que o "horror ao
infinito" gerou, ou ao menos contribuiu significativamente, para o
desenvolvimento da Álgebra Geométrica, que consistia na resolução de
problemas aritméticos ou algébricos lidando diretamente com grandezas
contínuas. A álgebra geométrica ficou registrada principalmente no
Livro II de Os Elementos de Euclides, obra cujos treze volumes foram
publicados entre 330 e 320 aC. A obra de Euclides representa o início
da busca que resultará no Cálculo Diferencial e Integral. Euclides
reúne toda a elaboração grega dos séculos anteriores, e registra o
momento em que os pesquisadores começam a se voltar para a
possibilidade da exploração da continuidade e da geometria em termos de
análise algébrica, interessando-se mais por métodos de redução como o
método de exaustão de Eudoxo. Não é por acaso que Arquimedes, bem como
todos os criadores do Cálculo no século dezessete, irão se voltar para
Euclides e tentar buscar aí as idéias do Cálculo.
Para verificarmos de que forma os gregos estavam próximos do Cálculo, é
preciso explicar antes o Método de Exaustão de Eudoxo e a utilização
que dele fez Arquimedes. O surgimento do Cálculo no século dezessete
está em plena conexão com a busca de meios de simplificar os métodos
gregos, como o método da exaustão. Para avaliar até que ponto chegaram
os gregos, basta verificar que Arquimedes (287-212 aC) realizou o
Cálculo da área sob a parábola antecipando-se, assim, em mais de
dezessete séculos aos resultados do Cálculo Integral. Muitos alunos
esbarram nas dificuldades representadas pela linguagem matemática do
Cálculo, e não pelas idéias em si. Afinal, como já falei, os gregos
estiveram a um passo da construção do Cálculo dois séculos antes de
Cristo, sem ter ainda sequer uma linguagem algébrica simbólica. As
idéias fundamentais do Cálculo podem ser assim construídas, desde que
se leve em consideração a distinção entre a lógica da Matemática pronta
e a lógica da Matemática em construção. A maneira de ensinar deve
seguir muito mais a lógica da Matemática em construção, e não a lógica
da Matemática pronta e formalizada.
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