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A admissão entanto operação
por Ricardo Scavino
Apresentarei alguns pontos que resumem a lógica que dá
sustentação à chamada admissão, entanto preliminar a um tratamento possível [ 01], pelo
menos até certo ponto, no marco hospitalar [02]. Sua formulação, um
pouco dogmática, obedece a um desejo de redução e brevidade, e aponta a um enfoque
formal do problema que possa servir como referência operativa, e permitir uma
localização mais precisa dos fenômenos que se apresentam em sua diversidade clínica.
O recorte que opera se
aloja aqui na conjunção/disjunção entre a psicanálise e o hospital, e responde ao
eixo da publicação que a motiva. |
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Existe uma
relação inversa entre a burocratização do lugar, e a incidência efetiva de sua
possibilidade operativa.
Isto decide sobre sua permanência ao campo da psicanálise é o lugar
correspondente à dimensão do sujeito. Situar o alcance e a natureza de sua operação
permite dissolver o obstáculo que impõe sua regulação institucional, instituindo
espaços flutuantes onde o encontro analítico se rende à lógica do inconsciente e a sua
temporalidade particular [03].
Pensar a
admissão entanto operação impõe ater-se a uma dimensão muito sutil, embora
operativa: adentrar-se numa disciplina do significante para concernir os fenômenos do
sujeito.
A noção de posição subjetiva - que,
colocando em jogo as categorias de enunciado e enunciação, incide na efetuação e na
localização do sujeito em termos da posição que adota em função dos seus dizeres [04], e de retificação
subjetiva, manobra dialética que estabelece um laço em relação à implicação do
sujeito em seu discurso [05]
- nos permitem apresentar o problema em termos de uma lógica da decisão, e leva ao
estabelecimento do inconsciente em ato.
Adianto algumas fórmulas:
- A admissão é um significante, correlativo da dimensão
da demanda, que se significa como demanda de ser admitido; redobra assim, por sua própria
nominação, o que é próprio do significante suscitar: admissão ou rejeição. Esta
margem o inscreve como lugar. É porque a demanda não é por si só provável -o que se
vê acentuado aqui pelo marco assistencial- que devemos abrir passo à decisão [06].
Admitir um
paciente em tratamento sanciona certa posição subjetiva, certo estado do sintoma,
autoriza um processo que requer certas condições, à falta dos quais não há modo de
engendrar uma necessidade de discurso, nem de conduzir a cura.
Por isso, não haverá admissão se não houver em jogo certa
dimensão de recusa, de Versagung, que abra à consideração do desejo.
Isto repercute para além do direito e do dever.
- O direito de ser assistido, nomeado, reconhecido na
doenç tropeç com um imperativo particular que impõe certa recusa. Há sempre um
elemento de iniciativa que exigimos, e uma posição subjetiva que devemos fazer surgir e
avaliar. Quer dizer, vetorizamos esse direito (que eventualmente traduz -ou poderia
traduzir- uma inércia, um aplanamento da responsabilidade do cidadão no marco
assistencial), deslizando sob seus pés o dever de uma decisão. Em suma,
trata-se de fazer surgir a singularidade do sujeito na modalização de seus ditos,
operando a partir do significante que o indicia como falta-em-ser, não para lhe
dar assistência, senão para pô-lo a trabalhar.
- Existe uma disjunção entre a lógica assistencial e
a lógica analítica.
Devemos efetivar uma mutação do sujeito da certeza da assistência
fazendo-o afeito de uma escolha [07]. E o que ali perde, traduz a aposta que o causa. Falamos, com Lacan,
de causação do sujeito [08].
Um sujeito
requer um lugar no Outro. Será concedido. Aqui o Outro é recoberto pela instituição.
Seu primeiro encontro é com o significante da admissão. Quem o recebe, opera com esse
significante.
O limite do
enquadre assistencial retroage sobre a admissão, isto é, a conforma. Mas, deve ser
notado que, se todo pode ser admitido, então algo ali não opera.
Problema: a saída (ou solução) ao alcance e
limite do assistencial (universal), para dar passo à uma lógica da decisão (do para
todo ao não-todo) [09].
A decisão
delimita um atravessamento, este deve ser marcado. Os fantasmas de pertenç à
instituição, por parte do analista, devem estar resolvidos, para poder ordenar-se na
lógica de seu ato.
Trata-se de
situar o inadmissível da posição assistencial (que traduz sempre um ponto de inércia,
um limite resistencial).
- Se a admissão localiza o inadmissível da posição
assistencial e dá lugar a uma lógica da decisão, então, desinstitucionaliza.
Algo deve ser
subtraí o como condição fundadora e, de efetuar-se o desenvolvimento transferencial,
este vem ao lugar do Outro barrado (a queda da instituição). Outro laço social se
instaura.
Ali, a
consideração da transferência impõe um véu sobre as condições particulares em que
poderá desenvolver-se ou não uma psicanálise.
Em seu conjunto,
as operações apresentadas concorrem com o estabelecimento do inconsciente, ou seja, com
a produção do sujeito.
Apresento estas operações como tendo maior poder fundador
que qualquer consideração diagnóstica que parta de uma semiologia, por fina que seja, e
até como sua condição preliminar, pois não podemos excluir do diagnóstico a
consideração da transferência. Produzir ao sujeito como vazio, na margem de qualquer
determinismo, ao mesmo tempo que autoriza para manobrar com o significante, também modula
seu encaminhamento libidinal, e permite representar como esse sujeito se prende numa
estrutura clínica... sob transferência.
Notas:
[01] As considerações propostas
foram postas a prova ao longo de um trabalho no Serviço de Psiquiatria - Consultórios
Externos - do Hospital Regional de Mar del Plata, durante os anos 1988/89 com residentes
de tal unidade, e mostraram ali sua fecundidade.
[02] Provavelmente, este
"preliminar" seria todo o tratamento possível "no hospital".
[03] A partir daí, os problemas
serão "internos", em direção à cura, e responderão caso por caso.
[04] Causa e consentimento
- J. A. Miller - 1987/88 (seminário inédito).
[05] Observações sobre a
transferência - J. Lacan Escritos.
[06] "Que o desejo seja
decidido". - J. Lacan - Televisão.
[07] A escolha forçada
J. Lacan Seminário XI.
[08] Posição do
inconsciente - J. Lacan - Escritos.
[09] Entende-se que, quando
estabeleço uma lógica da decisão, esta não é intersubjetiva, nem individual, pois
junta os partenaires em relação a um ato. |
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