O primeiro número da REVER deste ano de 2003 foi dedicado ao Protestantismo no Brasil. A reação dos leitores foi favorável. Dando seqüência à mesma linha editorial, o Número 2 é dedicado ao Catolicismo no Brasil. O tema é vasto e complexo. A equipe editorial de REVER sabe muito bem que em um único número da revista só se pode aflorar esta problemática tão ampla e heterogênea. No entanto, dada a quantidade de estudos que vão aparecendo em número crescente nos meios acadêmicos, pareceu aos editores que vale a pena reunir em um caderno algo do que se esboça hoje como tentativa de analisar a presente situação do Catolicismo no Brasil. Foram selecionados para tanto quadro artigos, além de um texto apresentado na secção de "Intercâmbio", no qual Alberto Antoniazzi – da PUC-MG – comenta a evolução do Catolicismo no conjunto das religiões presentes no Brasil, segundo os dados do censo de 2000. Este é um ponto de referência e quase que de partida para os demais artigos selecionados para a secção temática.
Os estudos sobre o Catolicismo no Brasil abrem com um texto de Lemuel Guerra, do Departamento de Sociologia e Antropologia da Universidade Federal da Paraíba, aborda o Catolicismo desde um prisma que afeta todas as religiões brasileiras em expansão ou em crise. Analisa em chave sociológica, seguindo pistas interessantes deixadas principalmente por P. Berger, Finke e Stark, bem como Stark e Ianaccone, os efeitos que a lógica mercadológica neoliberal exerce sobre recentes transformações que se observam na Igreja Católica. É notório que essa lógica atua, de maneira não desprezível, sobre os desejos e necessidades das pessoas e pressiona, além disto, os discursos e modelos institucionais oferecidos pelas igrejas. Esses tendem a voltar-se para a satisfação imediata dos objetos, objetivos e linguagens de maior peso no mercado religioso, seja espiritual, seja materialmente. É fácil constatar que o campo religioso católico experimenta, já há certo tempo, uma re-configuração que tem a ver com a competição de gerada pela pressão mercadológica. Essa tendência e essa problemática vêm sendo estudadas por vários autores, também brasileiras, já há algum tempo. Lemuel Guerra dá-lhes um enquadramento teórico melhor fundamentado, despertando a atenção do leitor para aspectos que pouco considerados em análises anteriores.
Sérgio Ricardo Coutinho, pesquisador e professor da Universidade Católica de Brasília, toma distância da linha de tipo histórico-eclesiológica predominante nos estudos do que se dá na Igreja e na pastoral católica. Sem desvalorizar a contribuição que investigações como as patrocinadas pelo CEHILA, ele julga importante ler o que se dá na história das dioceses, irmandades e congregações e movimentos da Igreja Católica em uma perspectiva menos "universalista". Seguindo a sugestão de Giuseppe Alberigo, ele estuda os 50 anos da história da diocese de Balsas, no sul do Maranhão, desde a perspectiva do "local", mais do que do "universal". Seu objetivo não é o de aprofundar "autocompreensão" que a diocese tem de seu itinerário, mas sim os níveis e instâncias de participação propiciadas dentro desta Igreja particular, em três de seus espaços ou "atos" mais emblemáticos e característicos: os de eleição, consenso e recepção. O quadro que daí resulta é original e termina com uma série de indagações e conclusões que mostram uma radiografia interna do processo de mudança trazido por práticas como as vividas em Balsas nesta última metade de século.
Cátia S.L. Rodrigues é a autora de uma pesquisa sobre a mulher católica. A formação desta jovem pesquisadora de São Paulo é psicológica. Ela dedicou sua tese de mestrado à análise de um grupo de jovens mulheres católicas que se viram presas dentro de um dilema de identidade definido por duas pressões contraditórias: a que vem do fato de elas serem católicas e por isto sujeitas ao que a Igreja oficial prega em termos de vivência sexual e matrimonial e, de outro lado, ao que elas experimentam em sua identidade sexual enquanto mulheres socializadas em uma cidade moderna como a de São Paulo. A autora analisa a questão não na perspectiva clínica e sim de modo empírico, buscando descrever e individuar concretamente os principais do conflito de identidade que ela constata nas 22 mulheres por ela que entrevistadas.
O último artigo traz a palestra pronunciada pelo Edênio Valle – professor da PUC/SP e membro da Comissão Editorial de REVER - em um simpósio realizado na Alemanha, em 2002, no qual se buscava captar as tendências observadas nas grandes religiões mundiais, na perspectiva dos vários continentes. O autor explica o conceito "macro-ecumenismo", indicando-o como uma tendência marcante no diálogo que o Cristianismo latino-americano tenta travar com as religiões autóctones do continente. O tema tem sido debatido em ambientes ecumênicos de ponta, mas o estudo em questão enfoca mais o pensamento e a práticas de diálogo do campo inter-religioso, sem ater-se às polêmicas internas que começam a se desenhar no interior da Teologia católica mais recente.
A Comissão Editorial espera que o número agrade e motive seus leitores/as. No futuro ela pensa em continuar abordando monograficamente, no futuro próximo, também outras religiões e movimentos religiosos expressivos de nossa época e contexto.
Comissão Editorial
Maria José F. Rosado Nunes
Frank Usarki
Edênio Valle