Neste terceiro número do ano de 2004, nossa Revista Eletrônica traz a seus leitores artigos relativos ao estudo de religiões não cristãs de procedência oriental. Trata-se de um número monográfico que busca detectar as tendências, desafios, transformações e reações que essas religiões, em expansão, provocam no mundo cristão. Há, assim, um cunho intercultural nos cinco artigos que constituem o tema central do presente número.
O primeiro deles trata do Islã, religião e cultura que se encontram no centro das atenções devido às conjunturas do momento mundial que estamos vivendo. Os demais artigos analisam a repercussão de algumas religiões de origem oriental - novas e da tradição - sobre o mundo cristão. A reflexão sobre o que se passa no mundo árabe é de Peter Demant, professor de História na USP. Como especialista em História da Ásia e em Relações Internacionais o autor se concentra em especial na análise das reações do Ocidente (leia, dos Estados Unidos) à maneira agressiva com que certos setores muçulmanos recebem a tentativa ocidental de impor seus interesses globais no Oriente Médio. No centro de sua atenção está o fenômeno do "terrorismo" ao qual recorrem grupos islâmicos que se ancoram em princípios e normas de seu livro sagrado, ameaçados pelos "valores" da modernidade ocidental. Não é a primeira vez que a REVER dedica espaço ao Islã, mas os interessantes aspectos políticos e religiosos indicados pelo Prof. Demant trazem elementos novos para a análise de uma situação cultural e religiosa em geral negligenciada e pouco conhecida entre nós.
O segundo texto, de Masanobu Yamada, da Universidade de Tenri, do Japão, enfrenta a questão da relação entre três "novas religiões" de origem japonesa com duas outras de matriz pentecostal-cristã. O autor compara a reação de brasileiros convertidos ao Seichô-no-Ie, Perfect Liberty e Tenrikyô com a de cristãos carismáticos, protestantes e católicos. Levanta diversos aspectos que diferenciam um e outro dos dois grupos e estabelece parâmetros comparativos entre ambos, tendo como eixo da análise a concepção vitalista da salvação.
Um jovem pesquisador paranaense que vem se dedicando ao estudo das artes marciais no Brasil reflete sobre as respostas que alguns pensadores cristãos buscam dar à penetração e popularização do Yoga em nosso e em outros países de tradição religiosa cristã. Rodrigo W. Apolloni descreve o que dizem alguns destes autores e grupos pioneiros no diálogo da ascese e espiritualidade cristãs com o yoga. Tenta levantar elementos teóricos para uma melhor compreensão da aproximação entre práticas culturais tradicionalmente distanciadas entre si.
Também Rafael Shoji, outro jovem estudioso das religiões orientais no Brasil, escolhe como tema de seu texto a chave da interculturalidade. Refere-se em seu estudo ao Budismo Chinês e Coreano, agora presentes no Brasil em virtude de uma significativa migração de coreanos e chineses. É uma temática quase inédita nas Ciências da Religião do Brasil. A aculturação dessas duas modalidades ao campo religioso brasileiro é comparada ao que se passou com o Budismo de extração japonesa. Shoji abre promissoras perspectivas para futuros estudos.
O último artigo é de Andréa G.S. Tomita. Seu trabalho vai igualmente na direção da interculturalidade. Os objetos de sua atenção são a Igreja Messiânica Mundial e a Perfect Liberty, duas expressões religiosas que já gozam de garantida presença no Brasil. Para a autora, que é Mestra em Língua, Literatura e Cultura Japonesa, na USP, as características orientais dessas duas neo-religiões foram "traduzidas" para a cultura religiosa de base existente no Brasil e passaram, com isto, a ser uma ponte entre os universos religiosos e culturais do Oriente e do Brasil.
Em sua secção "Intercâmbio" nossa Revista acolheu uma investigação realizada pela Professora Maria Ângela V.M.F. de Almeida, da PUC-SP. O estudo, à diferença dos artigos que compõem as monografias anteriores, nasceu da observação de um fenômeno religioso típico da religiosidade popular brasileira: o culto às almas dos mortos. Usando recursos sociológicos e antropológicos é enfocado o imaginário da morte presente em grupos católico-populares. Na análise de comportamentos concretos presentes no centro da cidade de São Paulo a autora discute a interação entre esses ritos e tradições com as circunstâncias e incidências sociais da trepidante realidade de quem vive e sobrevive na trepidante megalópole paulista.
A Comissão Editorial de REVER deseja aos leitores uma leitura proveitosa do rico material que lhes oferece no presente número.