Este artigo analisa os discursos de indivíduos fluminenses que se declaram sem religião, ressaltando aspectos que não são observáveis através da categoria censitária, que com essa nomenclatura não traduz a essência das transformações presentes na atualidade por se limitar à vinculação institucional, sem levar em conta a experiência religiosa. Trata-se do resultado de uma pesquisa qualitativa, produzida com entrevistas semi-estruturadas, aplicadas a 48 habitantes de diferentes localidades do Estado do Rio de Janeiro que se declararam sem religião; comprovando que, embora nos recenseamentos eles estejam agregados em uma só categoria, aparentemente secularizada, são constituídos por tipos com características e cosmovisões distintas, o que suscita uma classificação mais precisa. Se um deles reúne ateus e agnósticos, avessos aos conteúdos religiosos, o outro não os recusam, descolando-se somente das instituições religiosas.
Palavras-chaves: sem religião, secularização, religiosidade, desinstitucionalização
This paper proposes to analyze the discourses of inhabitants of Rio de Janeiro State who declare themselves as people without religion, emphasizing some aspects that seem hidden behind the mask of a census category unable to traduce the essence of the contemporary transformations in the field of religion. It seems reduced in terms of disaffiliation without considering the religious experience of the people. This approach is based on the results of a qualitative research produced from interviews with 48 inhabitants of different cities of the State of Rio de Janeiro who declared themselves to be without religion. This proves that, although they are grouped in the census as an only one category, apparently interpreted as a proof of the secularization of mentality, they may be divided into two types that present different characteristics and views. While one of them is constituted by atheists and agnostics, far from the religious contents, the other shows a kind of religiousness not identified with institutionalized religions and churches.
Keywords: without religion, secularization, religiousness, disaffiliation
O acompanhamento dos resultados dos recenseamentos demográficos do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) desde 1950 revela transformações acentuadas na declaração de identidade religiosa do brasileiro, entre as quais o declínio do número de católicos, o aumento do de evangélicos e o surgimento da categoria de pessoas sem religião. Essa categoria é no censo brasileiro relativamente nova: só foi desvinculada daquela que contabilizava os que não tinham respondido a questão a partir da década de 1960, quando os sem religião representavam 0,5% da população. Em 30 anos, a aceleração do ritmo de crescimento desse grupo os levou dos 0,8% em 1970 para 7,3% da população nacional em 2000[1].
O objetivo deste trabalho é refletir mais acuradamente sobre o significado dessa categoria residual, buscando compreender o sentido dessa crescente falta de identidade religiosa. Será que ela poderia ser traduzida como ausência de práticas e crenças religiosas? Que mudanças no comportamento religioso esses dados refletem de fato? A presente pesquisa busca responder essas questões a partir de dados coletados entre indivíduos que se declaravam sem religião.
Atualmente o Sudeste brasileiro é a região que ostenta o percentual mais acentuado de indivíduos que se identificam como sem religião. O Estado do Rio de Janeiro se destaca com o maior percentual (15,76%), o que me levou a escolhê-lo como lócus para minha pesquisa. Em valores absolutos, o Estado fluminense comporta 2.268.018 indivíduos sem religião. Diante disso, para obter uma amostra representativa da população total de sem religião[2], eu poderia aplicar 385 questionários objetivos. Entretanto, como optei pela utilização de uma metodologia qualitativa para investigar o grupo, não me preocupei com quantos indivíduos deveria encontrar, mas sim com a diversidade que poderia encontrar através de entrevistas mais aprofundadas, desvendando suas nuances e motivações que me permitiriam conhecê-los.
Embora constitua um referencial estatístico populacional importante na sociedade contemporânea, os sem religião não estão circunscritos numa localidade distante, mas podem estar espalhados por qualquer lugar. Não têm paradeiro, nem estão vinculados a clubes ou a nenhum tipo de agremiação. Alguns até podem ser encontrados dentro de comunidades virtuais de defesa do ateísmo ou do agnosticismo, mas, até onde investiguei, essas não sintetizam todos os seus matizes, constituindo-se como variações. Trata-se, como já sinalizado, de uma categoria heterogênea, espalhada por diversas áreas geográficas e segmentos populacionais, com maior ou menor intensidade.
Ao esbarrar na principal dificuldade imposta pela natureza de meu objeto, a falta de um referencial, de uma localização geográfica para encontrá-lo, resolvi partir estrategicamente de minhas próprias redes de sociabilidade para fazer as entrevistas. Sondei amigos, amigos de amigos, colegas de atividades e vizinhos, em busca de indivíduos que se definiam como sem religião, como numa corrente onde um indivíduo conduzia a outro, até formar um grupo diversificado. Também contei com contatos casuais e, assim, de janeiro a dezembro de 2006, entrevistei 48 habitantes da Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro que se definiam como sem religião, a fim de mergulhar um pouco na sua individualidade para esboçar suas principais características e motivações.
Para selecionar meus informantes, adotei uma pergunta-chave para conhecer a sua identidade religiosa: “quando um recenseador lhe pergunta qual a sua religião, o que você responde?” Aqueles que diziam não ter religião, ou se definiam como ateus ou agnósticos, eram convidados para uma conversa. Realizei entrevistas semi-estruturadas a partir de um roteiro que amarrou a minha problemática central dando, no entanto, uma certa abertura para que o entrevistado pudesse acrescentar novas informações. Esse roteiro foi sendo modificado principalmente a partir da interação com os entrevistados. À medida que ampliava o número de entrevistas, descobria novos detalhes sobre o comportamento de meus informantes e, assim, ia incluindo novas perguntas. Cada informação fornecida espontaneamente pelo entrevistado ajudava a aperfeiçoar uma pergunta ou, formular uma outra. Elaborei 36 perguntas fechadas e abertas, começando por aquelas que me permitiam construir um perfil demográfico e socioeconômico de cada informante, localizando-o geograficamente. Assim, perguntei sexo, idade, estado civil, cor ou raça, escolaridade, ocupação e renda, uma vez que essas características básicas poderiam interferir na experiência de cada indivíduo com conteúdos e instituições religiosas. De posse de tais informações, poderia, ainda, tentar compará-las com alguns cruzamentos dos recenseamentos populacionais e, assim, descobrir diferentes vertentes para investigação. Também elaborei questões mais pontuais sobre a situação e formação religiosa do entrevistado, bem como sobre fatores que poderiam tê-lo influenciado, o que incluía desde perguntas sobre a religião dos pais até a influência da leitura sobre sua opção. Detalhes da trajetória de cada indivíduo me permitiram identificar alguns dos possíveis motivos da sua desconversão, nos casos em que isso ocorria, assim como suas crenças e atitudes diante das instituições religiosas. Embora tenha aplicado um roteiro extenso, cujos resultados me possibilitam discutir vários aspectos dos sem religião, este artigo está concentrado na análise da atitude do indivíduo diante das instituições religiosas. Essas informações me permitiram chegar a um desenho mais minucioso de uma pequena parte da população sem religião residente em diferentes cidades do Estado do Rio de Janeiro.
Entre as vantagens que encontrei para a realização de entrevistas partindo de minhas relações particulares está, principalmente, o grau de confiança que o entrevistado deposita no entrevistador, não só facilitando seu trabalho no que se refere à quantidade e qualidade de informações fornecidas, mas também auxiliando na indicação de outros informantes potenciais. Segundo TOURTIER-BONAZZI, (2006: 235) em seu ensaio sobre a seleção de testemunhos orais, o que também parece válido para os demais métodos que utilizam resultados de entrevistas, “... é indispensável criar uma relação de confiança entre informante e entrevistador”. A recomendação do entrevistador funciona como uma espécie de cartão de visita ou crédito que vai abrindo novas frentes de contatos. Com isso, as informações fluem com mais facilidade e segurança, podendo, ainda, ser conferidas e reconferidas se necessário. Sendo assim, muitas entrevistas foram realizadas em múltiplas conversas individuais, o que alongou o tempo total delas, resultando no recomendado aprofundamento das mesmas, o que, conforme ressalta Mirian Goldenberg (2003:47) permite “... a eliminação do bias do pesquisador”. Entre as desvantagens de recorrer aos contatos particulares como ponto de partida para o campo está, principalmente, a seleção inevitável decorrente do processo, que pode inicialmente limitar os tipos de indivíduos às variações sociodemográficas existentes dentro de um determinado grupo de contatos, o que pode ser atenuado na medida em que os braços se alongam e, ainda, quando incluem contatos incidentais, contribuindo para a ampliação do campo.
Embora a realização de entrevistas com pessoas encontradas acidentalmente possa não ser comumentemente referida ou recomendada por pesquisadores, essa estratégia foi útil em meu trabalho e me fez perceber que o efeito surpresa também pode contribuir para que o entrevistado seja mais espontâneo em suas respostas, reduzindo algumas vezes, portanto, os biases envolvidos na interação entrevistado-entrevistador. É preciso admitir que, em certas situações, o entrevistado pode sentir-se até mais à vontade para falar de determinados assuntos com entrevistadores desconhecidos, com os quais provavelmente não voltará mais a se encontrar, do que diante de conhecidos, que compartilham de seus círculos de amizades. A desvantagem dessa situação de entrevista é que, na maioria das vezes, o pesquisador não tem como confirmar as informações e, em caso de dúvida, não terá como dirimi-la. Mas uma dose de risco está sempre embutida em qualquer tipo de entrevista.
A coleta foi realizada em duas etapas: a primeira, de janeiro a junho, com 28 entrevistas que me proporcionaram uma visão geral do campo; e a segunda, de julho a dezembro, acrescentando mais 20 delas com indivíduos sem religião de ambos os sexos, diversas faixas etárias, graus de escolaridade, níveis socioeconômico e cor ou raça. Embora as pessoas não se importassem com a revelação de suas identidades, preferi adotar pseudônimos para não expô-las. Coincidentemente, meu grupo está representado por indivíduos residentes em determinadas regiões geográficas que também receberam destaque dentro do ranking do IBGE. Do meu total (48), nove eram residentes na Baixada Fluminense (Belford Roxo, Japeri, São João de Meriti e Nova Iguaçu), cinco em Niterói e 34 viviam em vários bairros do Município do Rio de Janeiro. Comparando essa amostra com os números do Censo 2000 para a população urbana, entre os municípios mencionados, o Rio de Janeiro se destaca em representatividade dos sem religião, com 35,9% de todo o Estado (781 mil), seguido por Nova Iguaçu, com 9,3% (201 mil), Belford Roxo, com 5,4% (117 mil), São João de Meriti, 4,2% (91 mil), Niterói, com 2,9% (63 mil) e Japeri, com 1% (21 mil).
Embora ainda sejam poucos os trabalhos sobre os sem religião, outros pesquisadores já fizeram suas incursões no tema, identificando variações da categoria (MARIZ; MACHADO, 1998; FONSECA, 2000, 1999; NOVAES, 2004, 2006; FERNANDES, 2006), interpretando-os, sobretudo, como indivíduos descolados das instituições religiosas. Em suas avaliações das mudanças reveladoras do campo religioso brasileiro, as sociólogas MARIZ; MACHADO (1998: 36) já alertavam que aqueles classificados pelos recenseamentos como sem religião, “... não podem e não devem ser confundidos com ateus ou descrentes da existência de Deus”. Nessa mesma direção, em sua interpretação do Censo 2000, JACOB (2003: 115) ratificou que “... o fato de um indivíduo se declarar sem religião não significa, ipso facto, que ele seja ateu, isso porque uma parcela daqueles que se declaram sem religião, acreditam em deus sem participar, no entanto, das instituições”.
Durante a triagem dos informantes, selecionando aqueles que se enquadravam no perfil que buscava, percebi que diante da minha pergunta se possui religião (para sabe se podiam ser parte de minha amostra), alguns indivíduos se confrontam com uma dúvida incomensurável quando se tratava de refletir sobre sua situação religiosa, como se assumir determinada identidade resultasse num comprometimento de sua imagem. O impasse foi tamanho que alguns se recusavam a dar entrevistas justificando que não tinham conhecimento teológico suficiente para conversar sobre religião, ou que não estavam preparados para esse tipo de conversa. Mas, felizmente, não foram muitos. Entre os que se mostraram mais disponíveis, mas que se colocavam em alguma fronteira do terreno religioso, não sabendo exatamente definir a sua posição, estavam aqueles que, por vezes, diziam que não tinham religião, por outras, que eram católicos não-praticantes. Com alguns precisei até ensaiar uma entrevista para perceber seus limites. Ainda que não tenha aproveitado todas as horas de conversa, mesmo esses encontros me renderam frutos, permitindo que eu comprovasse algumas sutilezas do panorama religioso nacional.
Assim, compreendi que como o Catolicismo tradicional não impõe aparentemente uma participação efetiva para manter a afiliação, alguns indivíduos pareciam sentir-se, dessa forma, mais livres para transitar por grupos diferentes, consumir novos bens religiosos, exercer sua religiosidade de forma particular, preservando a identidade religiosa herdada de suas famílias. MARIZ; MACHADO (1994: 26), ao refletirem sobre o sincretismo e trânsito religioso entre católicos carismáticos e evangélicos pentecostais, ressaltaram que “... embora em termos institucionais constatemos o monopólio religioso da Igreja Católica no Brasil, em termos dos fiéis, especialmente os de camadas populares, a prática religiosa tem se caracterizado por sua abertura a outras tradições”. Ou seja, o vínculo estabelecido pelo batismo não impede que um católico experimente esporadicamente outras práticas e rituais religiosos diferentes daqueles que lhes forram apresentados por sua família. Ele sente-se à vontade, assim, para assistir a um culto evangélico, participar de uma cerimônia budista ou de um ritual afro-brasileiro sem constrangimento e, posteriormente, participar de uma missa em sua igreja. Situação similar ocorre com alguns espíritas kardecistas com os quais conversei, que por vezes também demonstravam certa dúvida sobre sua identidade, deixando transparecer uma dificuldade, por alguma razão que precisa ser mais bem investigada, de assumir o Espiritismo como religião oficial.
Paralelamente, outros indivíduos informaram já terem percorrido um vasto circuito de experiências religiosas, em busca de uma crença com a qual se identificassem. Enquanto não encontravam o que definiam como “seu lugar”, definiam-se como sem religião, eram buscadores. Sendo assim, é preciso ressaltar que a ausência de pertencimento pode ser transitória, detectada num período de desencantamento, ou de experimentação, ou, mesmo uma escolha permanente, fundada numa concepção alternativa de espiritualidade, uma nova cosmovisão que parece marcar o mundo atual. Essa situação de busca de uma crença com a qual se identifiquem, ou mesmo de uma identidade, vai ao encontro do que sinalizou NOVAES (2006: 322), ao localizar, na sua pesquisa sobre a juventude, jovens muito jovens sem religião, em busca de si mesmos. Ela explicou que, no caso de seus entrevistados, “... declarar-se ateu ou agnóstico pode fazer parte do momento da vida que é importante a afirmação de identidade independente em relação à família, como aconteceu com outras gerações”.
O primeiro impulso que me ocorreu quando me deparei com uma categoria de indivíduos sem religião foi o de analisá-los sob o prisma de secularização, uma marca da chamada modernidade; contudo, ao verificar a diversidade intracategoria, percebi que o mesmo suporte não cobria todos os ângulos de meu campo. Conforme BERGER (1985: 119), secularização pode ser definida, na sua forma mais simples, como “... o processo pelo qual setores da sociedade e da cultura são subtraídos á dominação das instituições e símbolos religiosos”; ou seja, é a perda de status da igreja cristã na história da sociedade ocidental moderna, separada do Estado ou, ainda, um processo socioestrutural onde os conteúdos religiosos são subtraídos da vida pública, o que também compreende o terreno das artes, filosofia e literatura, abrindo espaço para o predomínio da ciência. Essa desobrigação da religião no espaço público se reflete no terreno subjetivo, permitindo, por conseguinte, a secularização da consciência do indivíduo. Nessa perspectiva, segundo o autor (idem:119-120), “... o Ocidente moderno tem produzido um número crescente de indivíduos que encaram o mundo e suas próprias vidas sem o recurso às interpretações religiosas”. A secularização, contudo, não ocorre da mesma forma e ao mesmo tempo em todos os lugares; mas emerge, ou não, em certos grupos e lugares, de acordo com cada contexto e suas influências; e nem atinge a todos, mas a certos indivíduos, diferentemente. Ela pode estar presente numa sociedade, mas em poucos ou nenhum indivíduo ou, ainda, em um indivíduo, mas não obrigatoriamente com o seu grupo ou seu país. Embora o indivíduo receba influências de seu meio, a secularização de uma consciência individual não está diretamente vinculada à vertente societal (ibid: 10).
Se inicialmente para Peter Berger e outros autores, a secularização parecia se apresentar como o futuro implacável da sociedade a caminho para o progresso, adiante ele constatou que nem todo conteúdo religioso sumira da sociedade moderna, dita secularizada, e que alguns grupos confessionais se fortaleciam, o que o levou a publicar uma espécie de mea culpa, identificando os equívocos na teoria da secularização. Ao enfatizar que a modernidade não traz consigo compulsoriamente o declínio das religiões, ele explica que, embora algumas instituições religiosas tenham perdido o poder e a influência em muitas sociedades, crenças e práticas religiosas permaneceram na vida das pessoas (ibid:10-17). Num mundo acreditado secularizado, reapareceram crenças sob novas formas institucionais, eventualmente levando a grandes explosões de fervor religioso, firmaram-se instituições religiosas prestando serviço social e organizando estratégias de conversão de massa, e, por fim, sobreviveram e floresceram comunidades religiosas que não tentaram se adaptar às supostas exigências do secular. No meio de tais transformações, Berger (2001:14-15) destacou dois surtos religiosos evidentes no mundo contemporâneo: o Islamismo e o Evangelismo.
É nesse contexto globalizado, contemporâneo, de confronto entre essas duas tendências, que estão instalados os indivíduos que se declaram sem religião; muitos dos quais claramente secularizados, representados essencialmente por ateus e agnósticos; enquanto outros embora convivendo em Estados laicos, apresentam experiência religiosa muito particular, descolada das instituições tradicionais, mas cultivando vínculos com o transcendente, embora nem sempre referente à noção cristã de deus.
Durante a realização das entrevistas com indivíduos que se declaravam sem religião, compreendi que o termo religião, para eles, poderia ser traduzido como afiliação a uma instituição religiosa; logo, um indivíduo com religião era aquele que pertencia e participava das atividades de uma instituição. A fim de estabelecerem a diferença entre seu sistema de crenças e essa noção de religião, alguns informantes explicavam que não tinham religião, mas sim religiosidade ou espiritualidade, ambos os termos com o mesmo sentido.
Esse foi o caso de um morador do bairro da Gávea, 49 anos, que afirmava não ter religião, mas espiritualidade. Mesmo tendo sido criado por pais católicos dentro dos ensinamentos católicos, ele não ficou preso a eles, tendo transitado conforme as configurações de cada momento de sua vida, entre outros grupos religiosos, como Umbanda e Hare Krishna, sem, contudo, afiliar-se a nenhum deles. Explicou: “... a espiritualidade não tem nada a ver com religião. A religião foi inventada pelos homens para tentar religar o Homem ao fictício elo perdido com a divindade e justificar a eterna busca indecifrável do sentido da vida” (D.B., entrevista, 29/10/2006, Rio de Janeiro). Segundo ele, cabe a cada indivíduo perceber os “... sinais espirituais e energéticos que cada pessoa tem” para se orientar independentemente de “intermediários” que ensinassem o que é o bem ou o mal. Foi possivelmente a observação de comportamentos semelhantes a esse que levou Paul HEELAS (2001: 358) a comentar que o século XXI é marcado mais por uma caminhada em direção à espiritualidade, do que pela religião, compreendida através de algumas definições clássicas. Essa seria, portanto, segundo o autor, a atual configuração do panorama religioso nas sociedades comerciais avançadas ocidentais.
Conforme HEELAS (2001), ainda que a erosão das instituições imponha uma aproximação do secular, não se constata, na atualidade, uma grande onda de ateísmo, agnosticismo ou simplesmente indiferença, e nem todas as formas de religião institucionalizadas estão indo mal; ao contrário, proliferam as demonstrações de espiritualidade. Na sua tentativa de estabelecer uma diferenciação entre o que seria a religião e a espiritualidade, Paul Heelas explicou que, enquanto a religião pode ser definida segundo a obediência a um deus transcendente e a uma tradição, que é a mediadora de sua autoridade, a espiritualidade se apresenta como a experiência do divino como imanente na vida. Sendo assim, o que aflora nos territórios, mais do que a tradição religiosa, é a espiritualidade, referida à experiência pessoal e interior com o sagrado. Essa articulação mais evidente com a espiritualidade está presente principalmente entre os movimentos de Nova Era (idem:361), o que pode ser concebida como uma espécie de revolução espiritual. Segundo ele, toda a espiritualidade da vida da Nova Era, que é destradicionalizada, se consolida no interior de cada um, no que ele chama de “vida verdadeira”.
Essa busca de uma espiritualidade vai ao encontro, em parte, do modelo sugerido pela teoria da orientalização do Ocidente de CAMPBELL (1997:5-22). De acordo com o autor, o mundo moderno vem passando por uma transformação revolucionária, despertando uma nova consciência ética nos indivíduos, mais tolerante com as várias verdades. Nela está embutida uma visão de mundo sincrética, voltada para o auto-aperfeiçoamento, individualizada, que substitui a idéia tradicional de salvação, desloca a noção de Igreja e troca a distinção entre crente e descrente pela noção de espiritualidade, que pode se estender além desta vida. É uma nova proposta de religiosidade, orientalizada, cujos indicativos podem ser observados através do surgimento de correntes como o Neo-Paganismo, os movimentos ambientalistas e de Nova Era, desenvolvendo um comportamento muito particular, religioso, mas não institucionalizado, evocando a integração do Homem com o universo, o que encurta a distância entre o Homem e a divindade, muitas vezes representada pelas forças da natureza.
Outro informante com comportamento semelhante foi M.C., 55 anos, residente do bairro de Botafogo. Nascido de família católica, ele foi batizado e fez a primeira comunhão, que considera ter sido sua “... primeira participação numa cerimônia iniciática” (M.C., entrevista, 05/06/2006, Rio de Janeiro), mas se declarava sem religião. Seu afastamento da Igreja Católica teve início na adolescência e se consolidou na vida adulta. A despeito disso, ele explicou que, no fundo, nunca deixou de ser cristão; apenas não pertencia mais a uma igreja. Disse: “tenho religiosidade, não religião. Isto significa que exerço o meu sentido e impulso de religiosidade, mas não dentro de uma religião constituída e institucionalizada. Ele frisou que deus faz parte de sua vida embora de uma forma diferente, gnóstica (e não agnóstica)”, mas não a religião.
Interessado por experiências fora do corpo, M.C. experimentou o que ele chamou de algumas “afiliações iniciáticas esotéricas, mas exercidas de forma absolutamente independente de religiões”. Seu percurso no que ele classificou como esoterismo tradicional começou na década de 1970, quando ingressou na Antiga e Mística Ordo Rosae Crucis (AMORC), onde desempenhou várias funções. Posteriormente, em 1989, migrou para uma outra forma de esoterismo, à qual se dedica até hoje, que são as ordens de cavalaria. Tornou-se cavaleiro da Ordem Soberana do Templo Iniciático-OSTI, de origem francesa, ajudando a fundar sua sede no Brasil; contudo ele não percebe nenhum desses grupos como associações religiosas, mas parece percebê-los como grupos de estudos.
Essa concepção de religiosidade como impulso natural do indivíduo parece afinada com as idéias de Simmel (apud RIBEIRO, 2006: 109-126), que estabelece diferenças entre a natureza religiosa e não-religiosa. Essa constituição está na natureza de determinados indivíduos, que se mostram impregnados de valores éticos e humanitários independentes de instituições religiosas, embora eles possam se encarregar, muitas vezes, de sua difusão. Conforme SIMMEL (1935: 9-10), aqueles de natureza religiosa vivem e configuram sua vida diferentemente dos demais e, ainda que vivessem isolados num território, sem sequer saberem da possibilidade da existência de um deus, não mudariam seu estilo de vida. Assim, o indivíduo não depende da religião tradicional ou de dogmas para guiar seus atos, uma vez que “funciona religiosamente”, movido por valores éticos e morais, o que abrange pensamento, sentimento e comportamento.
Outra expressão desse tipo de atitude, onde valores embutidos em doutrinas religiosas se apresentam como constitucionais do indivíduo pode ser reconhecida, além dos exemplos anteriores, através do discurso de L.N., 32 anos, residente no bairro de Vila Isabel, que cresceu sem religião. Embora seus pais se definam como católicos e tenha sido educado em um colégio batista, nunca foi batizado nem experimentou práticas dos dois grupos. Seus pais achavam que ele deveria escolher seu próprio caminho quando crescesse. A despeito do afastamento das instituições religiosas, segundo ele, os valores religiosos sempre estiveram muito presentes em sua via, o que o teria ajudado a “... discernir o certo do errado, contudo, sem as regras absolutas e dogmas de uma religião propriamente dita” (L.N., entrevista, 01/06/2006, Rio de Janeiro). Para ele, que acreditava na existência de uma força superior, não era importante ter religião, mas “religiosidade” e não religião.
Os conceitos de religiosidade e espiritualidade já foram discutidos por vários autores das diversas áreas, entre os quais AHMADI (2006: 51-73), ao estabelecer as diferenças entre eles para poder escolher aquele que iria utilizar na análise de suas pesquisas. Ele realizou trabalhos no campo da religião e saúde, investigando a relação entre religião, religiosidade e espiritualidade com o enfrentamento de doenças graves por pacientes na Suécia, uma sociedade secular e racionalmente organizada, onde os indivíduos são considerados não-religiosos, tornando-se difícil a aceitação de muitos aspectos das religiões tradicionais.
Ahmadi distinguiu religião das outras formas, definido-a como um fenômeno institucional e coletivo[3], enquanto a espiritualidade e a religiosidade estariam reportadas, às crenças e práticas individuais, não necessariamente atreladas a instituições. Para ele, o termo religiosidade parece ser mais utilizado no sentido mais estrito, vinculado à religião institucional, enquanto espiritualidade, mais subjetivo, indicando mais precisamente uma experiência individualizada do sagrado, o que pode resultar, assim, numa distinção do problema religioso do espiritual. Dessa forma, a espiritualidade pode ser concebida como a crença numa força ou poder superior, não necessariamente vinculada à palavra deus. Nessa crença está embutida uma a necessidade de encontrar uma orientação através da busca de significados para a vida, para a doença, para a morte, e, mesmo, para a relação do indivíduo com o divino, com os outros e consigo mesmo. Pode ser uma busca do sagrado, sem a necessidade de associação com uma religião convencional, podendo mesmo ser experimentada sem nenhuma fé, mitos, lendas ou superstições, praticada tanto dentro quanto fora do contexto religioso. Considerando as características de sua população, ele optou pela noção de espiritualidade, por parecer abranger tanto um âmbito religioso quanto não-religioso.
Partindo, então, dessas distinções para os discursos de meus informantes, que percebiam a noção de religião como referida diretamente às instituições, nas quais os indivíduos participam de ritos e celebrações coletivas, enquanto de outro lado, estavam as de religiosidade ou espiritualidade, como uma atitude particular de uma consciência transformada pela experiência do transcendente, optei pela utilização do termo religiosidade para classificá-los. Compreendendo, ainda, variações sutis dentro do grupo de entrevistados, passei a organizá-los em tipos sem e com religiosidade. Enquanto o primeiro elimina a religião junto com a imagem de deus ou qualquer outra força superior das suas explicações para os eventos da vida, o segundo descarta somente a instituição religiosa, que não julga necessária para manifestar sua religiosidade. Convém ressaltar que este termo também foi reconhecido nos discursos dos informantes da pesquisa mobilidade religiosa (FERNANDES, 2006: 36-37), na qual eles se declaravam com uma religiosidade própria. Segundo a autora, ele foi utilizado por indivíduos de vários estratos sociais que habitavam os grandes centros urbanos. Segundo ela, trata-se de uma “... disposição autônoma que procura dar conta da articulação entre um mosaico que integra símbolos e valores religiosos e a decisão de afiliação ou desfiliação institucional”.
Entre meus 48 entrevistados havia 24 indivíduos que se diziam ateus e agnósticos, os quais classifiquei como sem religiosidade e outros 24 que se assumiam como sem religião, a despeito de sua crença em deus ou algum ente superior, os quais classifiquei como com religiosidade. Vale ressaltar que essa distribuição não pretende sugerir que, dentro da categoria censitária dos sem religião, metade dos indivíduos seja de um tipo e a outra metade de outro. Minha pesquisa é qualitativa e os dados do Censo não nos permite sequer identificar aqueles que porventura tenham se definido como ateus ou agnósticos. FERNANDES (2006: 37) ressalta que o tipo de desfiliação radical representada pelo ceticismo e o ateísmo característico das sociedades européias não se impôs, ainda, no Brasil, como uma “condição identitária de peso”.
O primeiro grupo – sem religiosidade - se recusava a aceitar qualquer explicação transcendente, confiando que o mundo e o Homem são pura matéria, ambos sujeitos às deteriorações do tempo e dependentes dos avanços da ciência; enquanto o segundo – com religiosidade - mantinha estreitos vínculos com o sagrado. Eles não tinham laços com instituições religiosas, mas não rejeitavam o transcendente, não afastavam a idéia de um ente sobre-humano que pudesse monitorar o universo e, mesmo, em alguns casos, certos acontecimentos da vida de cada um. Estavam desligados das instituições religiosas, as quais consideram desnecessárias, deslocando sua religiosidade para uma esfera muito privada, estabelecendo uma relação muito particular com o sobrenatural, cultivando sua própria concepção de deus, diferente da noção cristã. Em geral, se referiam muito mais à uma energia presente na natureza do que a um personagem bíblico. Muitos percebiam deus como uma força integrada ao homem, percebendo o impulso religioso como um elemento constitucional da natureza humana, relegando a afiliação institucional como opção facultativa para expressão pública da crença. Em outras palavras, eles separavam a adesão a uma instituição religiosa da crença em um deus ou força superior e distinguiam espiritualidade e religiosidade de religião, dizendo-se em busca de religiosidade ou espiritualidade, lançando críticas às instituições religiosas. Eram indivíduos sem igreja. A flexibilidade dessa experiência parecia tamanha que um informante chegou a afirmar que tinha sua própria religião. Segundo A.D, 63 anos, morador do bairro da Lagoa: “... tenho a minha própria religião e tenho certeza que se existir um deus ou algo parecido, terei cumprido minha missão na Terra e serei recompensado pelos meus atos” (A.D., entrevista, 07/02/2006, Rio de Janeiro). Em suma, agregando, então, os tipos embutidos na categoria censitária dos sem religião, passei a classificá-los da seguinte forma: 1) indivíduos sem religiosidade, um tipo constituído prioritariamente por ateus e agnósticos, descrentes de qualquer força transcendente que possa impor-se à natureza humana, e 2) indivíduos com religiosidade, sem vínculos com instituições religiosas, mas que mantêm uma crença muito particular em alguma energia sobrenatural.
Foram 36 os entrevistados de todo o grupo que tiveram formação religiosa, tendo se desligado de suas instituições em algum momento da vida, pelos mais diversos motivos, sem pretender voltar a freqüentá-las. Entre aqueles pertencentes ao grupo de indivíduos com religiosidade (24), 10 vieram de famílias católicas, quatro de evangélicas, três de espíritas kardecistas, um de seguidores de cultos afro-brasileiros. Entre aqueles classificados como sem religiosidade (24), 14 vieram de famílias católicas, dois de famílias judaicas e um de seguidores de cultos afro-brasileiros. Os demais de ambos os tipos descendiam de famílias que não tinham religião.
De todo o grupo, 17 com religiosidade e 13 sem religiosidade lançaram algum tipo de crítica às instituições religiosas. Alguns apresentavam um profundo descontentamento com o sistema vigente, com seus líderes e suas normas, mostrando que dogmas já não são mais tão facilmente absorvidos, nem as regras acatadas. Tudo pode ser contestado. Cada grupo apresentou justificativas distintas, sendo que algumas críticas estiveram presentes em ambos os grupos, entre as quais: ao mercenarismo, excesso de normas, manipulação, fanatismo, intolerância, hipocrisia, falsidade, incoerência. A reprovação ao comportamento das lideranças religiosas, como produto de desapontamentos pessoais de alguns informantes que saíram de diferentes grupos (católicos, evangélicos e afro-brasileiros), ou, ainda, da recepção de notícias veiculadas pela mídia pareciam incrementar o desencantamento de indivíduos quanto às instituições religiosas.
Alguns informantes por muitas vezes acusavam as lideranças por pregarem valores que não conseguiam seguir, denegrindo suas instituições, conforme A J., 74 anos, residente no bairro do Recreio dos Bandeirantes: “... acredito que hoje a religião não tem verdadeiros seguidores. Ela é constituída mais de arrependidos do que qualquer outra coisa, do que pessoas que foram educadas na religião” (A.J., entrevista, 21/06/2006, Rio de Janeiro). Para ele, a instituição religiosa foi desmoralizada pelos “... homens que se apresentam como enviados de deus”. É importante reforçar que a crítica às instituições religiosas não ficou concentrada num segmento, mas perpassou todas as faixas etárias compreendidas na pesquisa. Entre as mais recorrentes estavam o fanatismo e a intolerância.
Entre aqueles classificados como indivíduos com religiosidade na faixa dos 20 anos alguns reclamaram da intolerância fomentada pelo fanatismo religioso, conforme C.S., 26 anos moradora do bairro do Grajaú, que reclamou da imposição de verdades universais por parte de grupos religiosos e reforçou: “... acho que tem o lado prejudicial da religião, da intolerância, de achar que a solução dos problemas do mundo está só no campo religioso” (C.S., entrevista, 05/04/2006, Rio de Janeiro). Esse tipo de crítica também surgiu entre os sem religiosidade, como E., 54 anos, moradora do bairro da Tijuca, também fez suas críticas à intolerância. Segundo ela: “... normalmente a religião leva à intolerância e à não aceitação das diferenças entre os seres humanos” (E., entrevista, 04/06/2006, Rio de Janeiro). Esta foi muito recorrente entre os entrevistados, contudo, mais marcante entre indivíduos originários de grupos étnicos, como judeus, advertindo sobre os riscos conflitos deflagrados pelas divergências nas esferas religiosa e política.
A L., 26 anos, sem religiosidade, moradora do bairro do Leblon, condicionou sua crítica: “... só critico as religiões quando o sentimento religioso aliena o indivíduo e o afasta dele mesmo, quando a religião fanatiza. Quando a religião cega o fiel” (A.L., entrevista, 14/06/2006, Rio de Janeiro). Na faixa dos 30 aos 40 anos, as críticas seguiram na mesma linha, como para R.L., 32 anos, que disse: “... o fanatismo é o que mais critico nas religiões, além do uso de escrituras sagradas como fonte de acusações e difamação da religião alheia” (R.L., entrevista, 10/07/2006, Belford Roxo), o que vai ao encontro do que disse I.M., 39 anos, residente no bairro de Guadalupe: “... minha maior crítica é a lavagem cerebral que algumas religiões tentam fazer nas pessoas, impondo seu modo de pensar e não permitindo que as mesmas tenham suas próprias opiniões” (I.M., entrevista, 07/03/2006, Rio de Janeiro). Outro informante com religiosidade, A F., 45 anos, residente no bairro do Engenho Novo, ressaltou: “... quando as pessoas são muito fanáticas, fica difícil a convivência” (A.F., entrevista, 20/06/2006, Rio de Janeiro).
Para muitos, principalmente aqueles sem religiosidade, a religião era vista como instrumento de poder, ou de mistificação. Eles percebiam as igrejas em geral como autoritárias e condenavam as estratégias acirradas de conversão, a mistificação e o charlatanismo. Para H.D., 41 anos, morador do bairro de Campo Grande, todas as instituições religiosas (protestantes, espíritas e católicos) eram incoerentes com suas pregações. Cresceu acompanhando a mãe, que não tinha com quem deixar os filhos, aos cultos de Umbanda e Candomblé, mas isso não fez com que ele seguisse a opção da mãe. Ele chegou a afirmar que, se para casar, um dia, ele precisasse freqüentar algum culto religioso, jamais casaria. Nunca aprendeu a rezar, nunca leu a Bíblia e garantiu que jamais a lerá. Segundo ele “... todas as religiões têm alguma coisa errada, sempre” (H.D., entrevista, 01/06/2006, Rio de Janeiro), crítica extensiva às igrejas católica e evangélica e, ainda, aos cultos afro-brasileiros. Ele explicou que líderes religiosos dizem uma coisa, mas fazem outra, impõe obrigações que deveriam ser opcionais. Para ele, “... esse negócio de ter que dar dízimo é um abuso. Essas coisas têm que ser por vontade própria e não obrigadas”.
Outra entrevistada, D.M., 44 anos, disse: “... a religião só serve para conseguir dinheiro e poder. Ninguém precisa de religião” (D.M., entrevista, 02/04/2006, São João de Meriti). Esse ponto de vista não foi distante do de C., 45 anos, moradora do bairro de Laranjeiras, que explicou que se decepcionou com as instituições religiosas a partir de seu contato com a história, que lhe apresentou uma igreja católica “terrivelmente cruel” e, em seguida, descobriu que deus não existia. A despeito de suas críticas, ela ponderou: “... o Cristianismo, que eu conheço mais, tem princípios, idéias muito boas. Tem, porém outras terríveis como a repulsa ao sexo, o papel secundário das mulheres, a cumplicidade com o extermínio de povos e culturas” (C., entrevista, 04/11/2006, Rio de Janeiro). Esta fundamentação das críticas na história da civilização também foi ao argumento apresentado por J.D., 52, morador do bairro da Boca do Mato: “... tomei conhecimento de desmandos graves do Cristianismo, como por exemplo, os tribunais da Inquisição, onde se torturavam e matavam em nome de deus. A religião e deus são instrumentos de poder” (J.D., entrevista, 25/10/2006, Rio de Janeiro). Dependendo da formação e formação do entrevistado, as críticas variavam, muitas vezes restringindo-se a uma instituição específica, que nem sempre era a de seu núcleo familiar. Por exemplo, indivíduos oriundos de famílias protestantes atacaram a idolatria da Igreja Católica, o sacrifício de animais dos cultos afro-brasileiros; enquanto aqueles de origem católica criticaram o mercenarismo e as empreitadas de conversão deflagradas pelos evangélicos, conforme D., 48 anos, residente no bairro de Jacarepaguá: “... salvo contra a Igreja Universal do Reino de Deus, que aos meus olhos ilude e toma dinheiro de seus fieis, eu não faço críticas aos religiosos; só acho que são ingênuos” (D., entrevista, 07/03/2006, Rio de Janeiro).
Críticas diferentes, entretanto, foram aquelas atribuídas aos próprios fiéis, por transferirem sua responsabilidade para entidades abstratas, à “ignorância do próprio indivíduo”, conforme R.S., 64 anos, sem religiosidade, moradora do bairro do Flamengo, para a qual o indivíduo não poderia esconder-se sob os desígnios de um ser abstrato para eximir-se de suas responsabilidades. Segundo ela: “... a religião faz com que o indivíduo transfira a sua responsabilidade pessoal para um ser superior. Para os medrosos e inseguros, é uma boa” (R.BS., entrevista, 26/10/2006, Rio de Janeiro). Outro informante, como R. Q., 49 anos, com religiosidade, residente no bairro da Tijuca, fez o mesmo tipo de crítica. Ele acusou as instituições religiosas de enganar os fiéis, afirmando ser inadmissível a entrega dos destinos dos indivíduos a um ente abstrato sem buscar solução na própria sociedade. Ele reforçou: “... também critico a alienação que muitas (ou quase todas) provocam” (R. Q., entrevista, 07/11/2006, Rio de Janeiro).
O quadro abaixo dá uma visão mais ampla das críticas mais freqüentes:
Com religiosidade | Sem religiosidade | Ambos |
---|---|---|
Igreja desmoralizada Dogmatismo Idolatria Preconceito |
Igreja como instituição de poder Estratégias de conversão forçada Mistificação, Charlatanismo Ignorância |
Mercenarismo Excesso de normas Rigor Controle Imposições Alienação Lavagem cerebral Manipulação Fanatismo Intolerância Hipocrisia Falsidade Incoerência Transferência de responsabilidade para deus |
As críticas às instituições religiosas, contudo, não impediram uma avaliação positiva da afiliação a uma instituição religiosa para alguns indivíduos. Segundo estes, a formação religiosa poderia ajudar a regular o comportamento individual, impedindo que se instale na sociedade um estado de natureza hobbesiano, de predação. A crença em alguma força sobrenatural poderia, assim, refrear os instintos humanos, ajudando no estabelecimento da ordem e no cultivo a sentimentos como respeito ao próximo e solidariedade.
Houve ateus e agnósticos, se, ou seja, pessoas sem religiosidade alguma, que percebiam positivamente os ensinamentos religiosos em determinadas situações. Contudo, eles sempre assumiam que os mesmos poderiam contribuir para outros indivíduos, que não eles mesmos. É como se eles atribuíssem às suas convicções, que os afastavam dos conteúdos religiosos, propriedades de uma verdade absoluta, ao alcance somente daqueles privilegiados, com elevado grau de esclarecimento e conscientização, mas concedendo, todavia, àqueles em patamares inferiores, a prerrogativa de encontrar na religião o ponto de equilíbrio necessário para a manutenção da coesão e da ordem social. Nessa ótica, a religião teria como função dar limites, disciplinar certos indivíduos e não todos. Esse foi o caso de G., 30 anos, morador do bairro do Flamengo: “... penso que a religião tem a sua utilidade para aqueles que acreditam” (G., entrevista, 17/02/2006, Rio de Janeiro).
Destacamos, entre os sem religiosidade que reconheciam uma certa positividade na religião, A L., 26 anos, moradora do Leblon, para a quem a religião serve para ordenar valores, nortear indivíduos e integrá-los. Para ela,
... reforça a coesão de um grupo e sua identidade. A religião pode ajudar o homem a suportar dores e misérias, ... pode faze-lo olhar para o próximo, se despir de coisas que não o ajudam em sua vida, pode ajuda-lo numa busca por essência, mais que por aparência. (A.L., entrevista, 14/06/2006,Rio de Janeiro)
Outro informante, G., 30 anos, morador do bairro do Flamengo, avaliou “... para aqueles que têm religião, ela é útil, pois todas elas pregam preceitos de moral e ética social” (G., entrevista, 17/02/2006, Rio de Janeiro).
Entre os classificados como com religiosidade, R.L., 32 anos, explicou: “... a religião serve principalmente para colocar regras na vida dos indivíduos, ajudá-los a organizar idéias e ter uma vida com um propósito altruístico” (R.L., entrevista, 10/07/2006, Belford Roxo). Para outro informante, A, 63 anos, morador do bairro da Lagoa: “... a religião é um dos fatores mais importantes para regrar a sociedade e limitar o lado animal do ser humano, criando barreiras para seus atos, motivando suas esperanças em recompensa pelo bem” (A.D., entrevista, 07/02/2006, Rio de Janeiro). Na mesma linha, L.N., 32 anos, morador do bairro de Vila Isabel, disse que a religião, como doutrina, é uma “... organizadora da sociedade”. Segundo ele: “a partir de seus dogmas, as pessoas assimilam e seguem um referencial de comportamento” (L.N., entrevista, 01/06/2006, Rio de Janeiro). Tal opinião foi compartilhada por A J., 74 anos, residente no bairro do Recreio dos Bandeirantes, que argumentou: “... a religião ensina valores, como o amor ao próximo, o perdão, a renúncia, os dez mandamentos” (A.J., entrevista, 21/06/2006, Rio de Janeiro). Todos pareciam reconhecer na religião uma fonte propagadora de valores morais e éticos, controlando os instintos predadores individuais através da suposta lei de deus, contendo, assim, um certo potencial educativo, no sentido mais amplo.
Outros informantes sem religiosidade reconheceram na religião um potencial terapêutico, servindo para tranqüilizar o indivíduo diante das suas inquietudes psíquicas, de seus medos, contribuindo, assim, para promover seu bem-estar físico, mental e emocional. Para J.L., 40 anos, morador do bairro de Piedade: “... a religião ajuda a suportar os sofrimentos e dá uma estabilidade existencial” (J.L., entrevista, 01/10/2006, Rio de Janeiro), as também como G.M., 18 anos, que explicou: “... a religião serve, para alguns, para se fortalecerem. Eles buscam uma religião quando não se dão bem na vida” (G.M., entrevista, 02/04/2006, São João de Meriti). Nessa perspectiva a religião funcionaria, então, como um remédio para algumas inquietações, confortando o indivíduo em alguns momentos. A religião, a fé, se constituiria como uma fonte de energia para superar as adversidades. Isso também pôde ser percebido através dos discursos daqueles que encontravam na religião uma fonte de explicações para o inexplicável, de esperança diante de dificuldades.
Há ainda os que atribuíam à religião a função de promover o autoconhecimento, dar sentido à vida, exercitar a fé e expressar a religiosidade, o que reforça que alguns indivíduos percebiam a religião como meio e não fim. De outro lado, informantes dos dois tipos, com e sem religiosidade, reconheceram que a religião pode auxiliar a disciplinar o indivíduo, confortá-lo, consolá-lo e, ainda, para explicar o que não tem explicação aparente.
Quando perguntados, enfim, sobre a razão de não terem religião, a maioria. alegou não sentir necessidade de praticar uma religião, ou de pertencer oficialmente a um grupo religioso, conforme F., 39 anos, sem religiosidade, ao destacar: “... não tenho religião porque não tenho necessidade de uma” (F., entrevista, 27/06/2006, Niterói).
Aqueles com religiosidade completaram a explicação, afirmando não ter necessidade de estar vinculado a um grupo religioso para reafirmar sua crença em algum ente transcendental, recusando intermediários para o contato com a divindade. Isso foi explicado por entrevistados com religiosidade, entre os quais D.B., 49 anos, residente no bairro da Gávea: “... eu não acredito que precise de alguém de fora para vir colocar divindade dentro de mim” (D.B., entrevista, 29/10/2006, Rio de Janeiro). Ele explicou que, por vezes, pequenos gestos cotidianos, sinais indicados por uma flor, uma pessoa, podem sinalizar o caminho a seguir, para ele: “... devemos celebrar e ritualizar a vida com as outras pessoas, mas não necessariamente vinculada à religião”. Essa compreensão foi encontrada também no discurso de I.M., 39 anos, moradora do bairro de Guadalupe: “... as pessoas acreditam em deus e têm fé, mas para isso não necessariamente precisam ter uma religião” (I.M., entrevista, 07/03/2006, Rio de Janeiro).
Se, para alguns, a ausência de pertencimento se apresentava como uma situação definitiva, uma opção pela ausência de identidade religiosa, para outros esse poderia ser o indicativo de uma situação de trânsito, na qual o indivíduo não se identificou com nenhum grupo que experimentou até o momento, como C.S., 26 anos, moradora do bairro do Grajaú: “... não tenho religião porque não me identifico com nenhuma doutrina religiosa, não me sinto encaixada em nenhuma delas” (C.S., entrevista, 05/04/2006, Rio de Janeiro).
Esse desencaixe das instituições religiosas, essa dificuldade de estabelecer vínculos, sobretudo entre indivíduos oriundos daqueles grupos mais permeáveis, parece uma marca registrada da sociedade contemporânea, explicada por PIERUCCI, para o qual
... nas sociedades pós-tradicionais os indivíduos tendem a se desencaixar de seus antigos laços, por mais confortáveis que antes pudessem parecer. Segundo ele, dessa forma se desencadearia um processo de desfiliação em que as pertenças sociais e culturais dos indivíduos, inclusive as religiosas, tornam-se opcionais e, mais que isso, revisáveis, e os vínculos, quase só experimentais, de baixa consistência. Sofrem fatalmente com isso, claro, as religiões tradicionais. (2004: 19)
De outra perspectiva, SENNETT (1998:15-22), que abordou as causas do empobrecimento da vida cívica moderna, poderia interpretar esse desligamento como conseqüência de um processo de erosão da vida pública ocasionado, sobretudo pelo seu deslocamento para a esfera privada e, desta, para a íntima. Como o indivíduo já não está mais preocupado com sua participação na sociedade, mas com suas próprias emoções e história, ele acaba se isolando, guiando-se pelo que Sennett chama de código narcisista. Trata-se de uma preocupação excessiva com a projeção do indivíduo, que tem conseqüências sociais e pessoais como a limitação da participação na vida pública e a fuga dos compromissos, decorrente principalmente do medo constante de atrair opiniões e gerar acontecimentos desagradáveis. Assim, o indivíduo se retira das associações, das instituições, transferindo toda sua vida para o espaço mais íntimo, longe do público, onde ele sente-se à vontade, inclusive, para estabelecer sua conversa particular com o divino, reprimindo manifestações públicas de emoções, opiniões, de religiosidade.
Revisitando todos os aspectos aqui já mencionados, ratificamos, de fato, que a categoria residual apresentada pelo IBGE sem religião não é uma massa homogênea, mas um grupo de indivíduos de tipos diferentes que, se por um lado têm em comum a ausência de pertencimento institucional, por outro percebem o transcendente, aqui compreendido como deus, uma força superior ou afins, de forma diferenciada. Sendo assim, a categoria censitária não parece corresponder ao âmago do que ela pretende definir, traduzindo a realidade nacional, uma vez que não contempla todos os ângulos do que apresenta como uma unidade. Trata-se, portanto, de uma categoria limitada, reduzida à evidente desvinculação institucional sem, contudo, refletir a experiência religiosa dos indivíduos nela reunidos. Enfim, a categoria dos sem religião identificada pelo IBGE deve ser compreendida como um agregado de tipos de indivíduos sem vínculos com instituições religiosas, mas não desprovidos de crença. Nesse sentido, se ela apresenta, de um lado, indivíduos aparentemente secularizados, de outro apresenta, também, indivíduos aparentemente dessecularizados, para utilizar os termos de Berger (2001), mostrando que, na contemporaneidade, a evolução de uma categoria que poderia ser percebida como uma massa de ateus também congrega indivíduos com muita religiosidade ou espiritualidade, reinterpretando os conteúdos religiosos de uma forma muito particular. Ou seja, definir-se como sem religião não significa afastar o transcendental de sua vida, embora descolado de instituições religiosas.
O século XXI, nas sociedades ocidentais urbanas globalizadas, parece abrigar, assim, um ser autônomo, exercendo plenamente o conjunto de liberdades adquiridas ao longo do tempo, gozando de seu livre arbítrio, apto para administrar questões de ordem religiosa como melhor lhe parecer. É senhor de sua vontade, comprometido apenas com sua própria satisfação e com sua consciência. Se há alguns anos, para certos indivíduos poderia parecer constrangedor, excludente, não pertencer à maioria religiosa de seu país, para outros, posteriormente, esse engajamento se tornou facultativo, uma questão de escolha individual. Convém ressaltar que a amplitude de ofertas permitindo que o indivíduo experimente conteúdos religiosos diferentes daqueles herdados de sua família, associado à grande circulação de informações e a processos de desencantamento individuais, podem estimular o senso crítico do indivíduo, descolando-o de instituições. O desapontamento com líderes e instituições religiosas sugere que o crescimento da categoria de indivíduos sem religião registrado pelo Censo 2000 pode estar atrelado, entre muitos fatores, a uma crise institucional, a um baixo grau de confiança em instituições religiosas tradicionais e seus representantes. Isso já teria sido sinalizado por MARIZ; MACHADO (1998:36) quando alertaram que certas mudanças no campo religioso contemporâneo “... podem ser sistematizadas em função do enfraquecimento da religiosidade institucionalizada e o fortalecimento da subjetivização dos sistemas de crenças e das experiências religiosas de caráter emocional”.
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Recebido: 20/08/2007
Aceite final: 29/11/2007
[*] Denise dos Santos Rodrigues é doutoranda do Programa de pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – PPCIS/UERJ, vinculada à Linha de Pesquisa Religião e Movimentos Sociais em Perspectiva e Mestre em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisa – IUPERJ, Rio de Janeiro, Brasil.
[1] O recenseamento demográfico de 2000 contabiliza 12.492.403 pessoas sem religião no Brasil, correspondendo a 7,35% da população. Em 1970 eles estavam contabilizados em 700 mil.
[2] A obter uma amostra representativa de uma população de 2.268.018 pessoas, tendo como parâmetros 0.95 de grau de confiança, 0.05 de desvio-padrão e de e 0.50 de proporção, seria necessário aplicar 385 questionários, número que também seria ideal para uma população de 2.177.017 pessoas, sob as mesmas condições. Se, contudo, o desvio-padrão fosse aumentado para 0.07, a amostra poderia ser constituída por 197 pessoas.
[3] A religião, segundo o autor, é freqüentemente definida como uma estrutura para um sistema de crenças, valores, códigos de conduta e rituais, que constituem uma prática externa do conhecimento espiritual. Ela congrega as experiências extraordinárias dos indivíduos em relação ao transcendente, claramente diferentes da realidade quotidiana.