Após definir o que é Psicologia da Religião, o autor assinala que esta disciplina pode ser estudada a partir de várias perspectivas, mas desde uma perspectiva que permita distinguir suas características propriamente psicológicas. A Psicologia Cultural oferece exatamente esta possibilidade. Embora possam ser identificados vários tipos de Psicologia Cultural, o desafio contemporâneo para a Psicologia da Religião é o emprego daquelas aproximações que permitem a conceituação e investigação das relações entre religião como fenômeno cultural e o funcionamento psíquico. Este artigo passa em revista algumas teorias antigas da Psicologia compatíveis com o insight da Psicologia Cultural, para discutir, em seguida, algumas aproximações mais promissoras e comentar outras que estudam a Religião por meio da Psicologia.
Palavras chave: Psicologia da Religião, Psicologia cultural da religião, Religião e cultura.
After defining the meaning of the Psychology of Religion, the author affirms that the discipline can be studied from different perspectives, but always from a perspective that permits one to distinguish the psychological characteristics of religion. Cultural Psychology offers exactly such a possibility. Although one can distinguish various types of Cultural Psychology, the contemporary challenge for the Psychology of Religion is the use of approaches which allow the conceptualization and investigation of the relationships between religion as a cultural phenomenon and psychic functions. This article revisits some older theories of Psychology compatible with the insight of Cultural Psychology, and to discuss some promising approaches and comments on others that study Religion through Psychology.
Keywords: Psychology of Religion, Cultural Psychology of Religion, Religion and Culture
Poderíamos começar elogiando a Psicologia da Religião. Nunca antes houve tantas publicações e tantos encontros e conferências sobre religião, tal o interesse dentro e fora da Academia sobre o que a Psicologia tem a dizer a respeito da religião e da espiritualidade. Redes se estabelecem, jornais são fundados, pessoas são citadas – parece que o campo está verdadeiramente se desenvolvendo bem. Vindo de alguém como eu, alguém que faz de sua vida o estudo da Psicologia da Religião, deveria haver apenas elogios para ta disciplina. E ainda, vindo de um acadêmico - alguém de quem se espera seriedade e rigor -, após ter feito os elogios acima, desejo, imediatamente, acrescentar alguns pontos que são motivo mais de preocupação do que de louvor. Nada do que eu disse é incorreto ou não verdadeiro, mas, não é a única verdade. Eu deveria, ao menos, apontar a semelhança entre o momento atual e aquele de cem anos atrás, quando a Psicologia da Religião foi rapidamente ganhando audiência e, fora e dentro da Psicologia, foram sendo fundados jornais e estabelecidas organizações. Não deveríamos, porém, esquecer o que aconteceu entre estes dois picos de atividade: houve um enorme declínio; e agora, o presente crescimento do campo.
Como esta palestra não trata de História, não vou insistir sobre as razões nem daquele declínio, nem do presente crescimento do campo. Quero, no entanto, partilhar algumas preocupações e apontar alguns remédios, assim como os compreendo hoje. Antes de fazer isso, porém, eu deveria acrescentar algumas nuances sobre aquilo o que disse a respeito do florescimento da disciplina. Certamente é grande o interesse em saber o que a Psicologia da religião tem a dizer a respeito da religião e da religiosidade ou espiritualidade etc. É importante perceber que nem tudo o que é psicológico na religião é, de fato, Psicologia da Religião. Colocado de modo mais incisivo, é mais provável que a maioria desses livros e atividades não pertençam à Psicologia da Religião. Tal posição admite que a expressão Psicologia da Religião pode, ela própria, levantar problemas de compreensão.
Brevemente, o que a expressão não significa é justamente que qualquer psicologia pertença a, seja parte de, articule ou sirva à perspectiva de qualquer religião em particular. Psicologia da Religião não é o mesmo que Psicologia Religiosa (como a disciplina foi erroneamente designada por décadas). Em nosso ramo científico, a meta é a de fazer uso de instrumentos psicológicos (teorias, conceitos, intuições, métodos e técnicas) para analisar e entender a religião.
Isto vem sendo feito a partir de uma visão erudita, de uma perspectiva distante, tão despersonalizada quanto possível, como se requer em todas as disciplinas acadêmicas (Religionswissenschaften) que lidam com a religião, como a História, a Sociologia, a Antropologia, a Economia da Eeligião e muitas outras. Admito, de imediato, que cada tradição religiosa contém em si muito de intuição psicológica, que conselheiros, diretores espirituais e outros bons profissionais da religião apresentam insights respeitáveis sobre o funcionamento da psiquê humana. Veja-se, por exemplo, o relato que Levine (2000) faz das tradições budistas. Contudo, isto não deveria ser chamado de Psicologia da Religião. O mesmo se diga do conhecimento gerado por escritores e poetas. Também ele não deveria ser visto como científico. Além disto, há considerável conhecimento de psicologia fundado em ideias religiosas. Exemplos bem conhecidos incluem a psicologia de Jung, várias publicações esotéricas e a perspectiva transacional, mas, por mais interessantes que pareçam, não podem ser consideradas parte da Psicologia da Religião, a não ser pelos próprios autores.
Como não desejo que esta palestra se torne meramente uma enumeração de todos os tipos de psicologia relacionados com Religião que não são Psicologia da Religião, mencionarei apenas mais uma categoria: a assim chamada Psicologia Pastoral. Os trabalhos realizados nesta área são usualmente de muito boa qualidade acadêmica, mas o que há por trás destes trabalhos mostra a diferença da Psicologia da Religião em seu sentido próprio: a Psicologia Pastoral serve a propósitos religiosos; é a psicologia que ajuda o pastor. É a psicologia que foi desenvolvida e seguida para facilitar os objetivos das igrejas cristãs. Não há nada de errado nisto, é claro, e dentro da Psicologia Pastoral as pessoas estão geralmente muito familiarizadas e empregam bem a Psicologia da Religião. O ponto é que esta última é primordialmente neutra em relação a seu objeto e não adota posições de combate à religião; ela simplesmente a analisa e compreende. (BELZEN 1995, 1996). Olhando desde este prisma, uma visão crítica disto tudo deveria ser que a de dizer que parece não se tratar, de forma alguma, de uma Psicologia da Religião.
O que acabo de afirmar é correto em sua essência. Se tomarmos, por exemplo, a maior organização de Psicologia do mundo, a Associação Americana de Psicologia, e se considerarmos sua divisão para a Psicologia da Religião, de porte médio entre as divisões da APA, perceberemos que a grande maioria de seus membros não está interessada em Psicologia da Religião, no sentido mais próprio do termo. A maioria dos membros tem um interesse apenas privado em religião e um bom número deles está interessado em integrar a religião em seus trabalhos como, por exemplo, os profissionais da clínica. Lembrem-se de que, antes de 1992, a Divisão 36 da APA era chamada de “psicólogos interessados em questões religiosas”. Há várias forças trabalhando para o retorno a esse nome ou para a mudança para o nome de Psicologia da Religião e Espiritualidade conforme discussões em recentes números do periódico da Divisão.
A Psicologia da Religião, portanto, é um campo científico de médio tamanho com um número limitado de participantes pelo mundo. São várias as excelentes resenhas das teorias desse campo, especialmente as mais antigas, em Wulff (1979) e a visão geral das pesquisas contemporâneas de Spilka, Hood, Hunsberger, Gorsuch (2003). É um campo que está indo muito bem e há realmente motivos para elogiar, embora se deva saber o que se está elogiando e também que elogios se devam dar.
Gostaria de mencionar alguns indicadores da vitalidade do campo que inclui as investigações empíricas resenhadas por Beit Hallahmi e Arguile, por exemplo. Em 1997 eles publicaram uma versão mais moderna do seu livro Psicologia Social da Religião (1975). Quando os dois volumes são comparados é impressionante ver o aumento dos trabalhos em pesquisas empíricas que foram incluídos. Outro exemplo: há dez anos, não havia sequer uma introdução ao campo específico da Psicologia da Religião; hoje, existem várias. (ARGUILE 2000; LOWENTAL 2000).
Em grande medida, isso é certamente o resultado do número crescente de investigações e publicações psicológicas em geral. Resulta, também, do fato de a religião ser um tema bem menos tabu na Psicologia do que era há alguns anos. A Associação Psicológica Americana publicou recentemente um número especial que se figurou entre os mais vendidos (RICHARD; BERGIN 1997, 2000; SHAFRANSKE 1996). Se, no entanto, perguntarmos se existe um grande progresso na Psicologia da Religião (um crescimento quantitativo), a resposta é ainda modesta. Queda em aberto se aprendemos realmente mais a respeito da religião ao longo dos últimos vinte anos e se aprendemos a lidar mais adequadamente com religião em pesquisa psicológica ou com outros ramos de trabalho profissional em Psicologia. Gostaria, especialmente, de me ater a um ponto que considero muito problemático.
São muitos os problemas com o objeto de nossa disciplina. Vou tocar somente em dois deles. Primeiro, como vimos acima, o objeto da PR é “a religião”. Isto soa muito simples, quase tautológico. No entanto de forma alguma está claro o que é religião. Para resumir grosseiramente o que é religião (PLATVOET; MOLENDIJK 1999), deixem-me dizer que “religião” é um termo de tão largo espectro que não é possível ajuntar e incluir numa única onipotente e onipresente definição ou conceito a multiplicidade dos fenômenos chamados de religião (FEIL 1986, 1997; HAUSSIG 1999; KIPPENBERG 2001).
Para a Psicologia da Religião isto é um problema, mas não um problema especial ou específico: a definição e conceituação de religião é um problema para todas as Ciências.da Religião e pode ser provavelmente melhor resolvida por filósofos e fenomenólogos da religião (que podem contribuir para a solução do problema de modo mais amplo).
Eu chamaria atenção para outra pergunta: a Psicologia da Religião tem muito a dizer sobre seu real objeto, a religião? Esta é uma questão vital, pois, se for respondida negativamente, nós deveremos imediatamente perguntar o que a Psicologia da Religião fez ao longo de seu século de existência. E, na realidade, com toda a probabilidade, temos que admitir que a maioria dos trabalhos de Psicologia da Religião não versa sobre religião ou sobre fenômenos usualmente vistos como religiosos. Quase nada há sobre rituais, oração ou martírio, nada sobre milagres, devoção, padres ou santos, só para mencionar alguns fenômenos religiosos comuns. No máximo, a maior parte da Psicologia da Religião sobre religiosidade, sobre a participação (contrapartida) de um indivíduo em algum tipo de religião. Em grande parte isto é compreensível, pois a Psicologia é a ciência da psiquê, trata do funcionamento psíquico e isto é mais fácil de ser investigado via sujeitos individuais; a Psicologia, de modo geral, tem uma inclinação para o individual e o pessoal. Quero mencionar brevemente aqui, uma tragédia frequentemente observada (FOX e PRILLELTENSKY 1997): a maior parte da Psicologia não trata de indivíduos e pessoas, mas sim de presumíveis processos isolados ou mesmo somente de variáveis. No meio acadêmico, os experimentos são considerados o modo de pesquisa ideal: capazes de detectar e distinguir variáveis que podem então ser manipuladas em condições experimentais e, como resultado, ser generalizadas para um conhecimento sólido. Um dos problemas com tal abordagem, no entanto, é a sua validade limitada. Mesmo se fosse possível dissecar processos psíquicos em unidades que pudessem ser medidas e manipuladas, os resultados obtidos em laboratórios dificilmente poderiam ser aplicados nas situações muito mais complexas e imprevisíveis, quase incontroláveis, da vida real, distantes do que se dá em laboratórios. Além disto, no que concerne à religião, dever-se-ia inclusive perguntar se ela é, em si, sujeito de observação.
A Psicologia da Religião se orienta para a Psicologia em geral e, em consequência, um bom número de psicólogos da religião tentou distinguir tais variáveis, embora se deva notar que a maioria desses estudos empíricos não são experimentais, mas correlacionais (BELZEN; HOOD 2006).
Seguindo tendências da Psicologia em geral, as pesquisas na PR se focaram na religiosidade individual, frequentemente avaliada somente através de uma escala e correlacionada com outras questões (ex. satisfação geral e bem estar subjetivo, stress, ajustamento, desordens afetivas, trauma e intervenção, adições, cuidado com idosos e doentes). Ainda deveríamos perguntar se a Psicologia não cometeu seu maior erro ao enfocar quase que exclusivamente o indivíduo. A Psicologia fez isto devido ao seu esforço em espelhar-se nas Ciências Naturais, o que leva a ver como natural o seu próprio objeto de estudo. Este modus operandi é marcado pela dessubjetivação e descontextualização na medida em que tenta produzir conhecimentos universalmente válidos. Precisamente este último pressuposto é que precisa ser contestado, como já foi muitas vezes na história da Psicologia.
Já o fundador da Psicologia Experimental, Wilhelm Wundt, contestou a visão de que para entender os processos psíquicos superiores deveríamos nos restringir a investigar indivíduos. Como também outros pesquisadores deixaram claro, muitos processos psíquicos - como pensamento, aprendizagem, memória, etc -, são dependentes e condicionados pela linguagem e por outros processos de nossa aculturação.
A relação entre cultura e o funcionamento psíquico não pode ser estudada experimentalmente; precisa ser investigada com a ajuda de métodos desenvolvidos em outras ciências, tais como a História, Sociologia, Antropologia e outras.
Wundt concluiu que a Psicologia deve consistir em dois troncos: um experimental (é a psicologia experimental fisiológica) e outro que ele denominou Psicologia dos povos (Völkerpsychologie) e que poderíamos talvez chamar de Psicologia Social Científica ou mesmo de Psicologia Cultural. Na opinião de Wundt, a Psicologia deveria tomar como seu objeto de estudo não apenas os processos psíquicos individuais, mas igualmente tópicos como a linguagem, justiça, ética, costumes, sociedade e religião. Todos esses tópicos são claramente elementos da Cultura; nenhum deles é produzido por alguém individualmente; são produtos da atividade coordenada de vários indivíduos. Linguagem, por exemplo, não é dependente do indivíduo, é até oposto: o indivíduo, para ser capaz de falar deve adaptar-se à linguagem que já existe. O mesmo se passa em outros domínios da cultura: para sobreviver e tornar-se totalmente humano, cada criança precisa ser aculturada, precisa tornar-se participante de uma cultura.
Segundo Wundt, e isto é igualmente aplicável à religião, o estudo psicológico da Religião só é possível por meio da Psicologia Cultural (BELZEN 2005: 137-165). Em minha opinião, os insights de Wundt permanecem inteiramente válidos. É trágico que se tenha esquecido dos mesmos em função de sua Psicologia Experimental. Há várias razões para isto das quais não é o caso de me ocupar aqui, mas uma das mais importantes é o crescimento da Teoria Comportamental nos Estados Unidos, que focalizava especialmente os indivíduos, em larga medida ocultando como eles interagiam com a cultura. Além disso, no início dos estudos, os resultados prometidos iam mais na direção do lugar comum do que rumo a resultados convincentes.
Wundt desenvolveu suas ideias ao mesmo tempo em que Dilthey e Rickert diferenciavam Ciências Naturais das Ciências Humanas ou Culturais. Esses trabalhos iniciais perceberam que o funcionamento humano pode ser diferente, e frequentemente é, de acordo com os tempos e lugares em que se dá. No entanto, eles não tinham os instrumentos próprios (teorias, conceitos ou métodos de pesquisa) para explorar e conceituar essas descobertas - faltaram a Wundt algumas ferramentas essenciais. Ele ainda empregava noções como folkspirit e folksoul, pré-história e história, individuo e sociedade, as quais não são conceitos psicológicos. Desde então, de modo crescente e sempre, os psicólogos se orientaram de acordo com as Ciências Naturais de maior prestígio e perderam de vista os componentes sociais de suas disciplinas. Muitas teorias compatíveis com o urgente apelo de Wundt em favor de uma Psicologia Cultural se desenvolveram (embora não tenham sido aplicadas à Psicologia da Religião), mas muito frequentemente estas teorias ou eram negligenciadas (como aconteceu com os princípios de William James) ou eram formuladas por pessoas que na historiografia e na história da Psicologia passaram a ser vistas como não psicólogos, tais como George Herbert Mead ou Norbert Elias.
Isto posto, não estou simples e ingenuamente propondo um “retorno a Wundt”. A História segue seu caminho de maneira caprichosa e dialética ou, melhor dizendo: não há jeito algum de se retornar ao passado e, além disto, não existe razão alguma para fazê-lo. O que podemos e devemos fazer é nos dar conta do que nossos antecessores fizeram e disseram de modo a tirar daí vantagem em relação à situação atual.
Além disto, acredito que Wundt tenha exagerado. Embora concorde com ele que a religião é um fenômeno que se dá no nível da cultura (e não em nível individual), discordo de sua posição de que a investigação individual seja inútil. Vejo realmente a religiosidade como um dos objetos da Psicologia da Religião, mas há que se levar em conta dois importantes pontos: primeiro, a religiosidade deve ser estudada como o resultado de um ser humano embebido no nível cultural de uma dada religião e, segundo, a psicologia não deve esquecer de tentar dizer algo sobre a religião como um fenômeno cultural também.
O que proponho é que tentemos cultivar a Psicologia da Religião a partir da perspectiva da Psicologia Cultural. No restante desta palestra vou esboçar alguns elementos para uma Psicologia Cultural Contemporânea e perguntar se esta perspectiva permite dizer algo de valor sobre o, objeto de estudo de nossa disciplina, a religião. Permitam-me, antes disto e em primeiro lugar, delinear alguns tipos diferentes de Psicologia Cultural.
Como a Psicologia em geral, também a Psicologia da Religião é bastante extensa e é um empreendimento heterogêneo, através do qual muitos renomados psicólogos realizaram suas diversas contribuições. É importante ressaltar, desde o início, que a Psicologia da Religião não é inteiramente diferente de outras disciplinas desenvolvidas nos primeiros tempos da Psicologia; tampouco é uma subdisciplina separada ou simplesmente um campo de aplicação. Dito de modo abrangente, a Psicologia da Religião é uma abordagem situada no campo da Psicologia que tenta descrever, investigar e interpretar o inter-relacionamento entre a Cultura e o funcionamento psíquico.
É o ramo da Psicologia que tenta tomar a sério a observação geralmente superficial e trivializada de que ninguém pode existir sem o outro. E que, portanto, a cultura é o maior fator de toda conduta significativa humana e que traços da presença humana podem ser detectados em todas as expressões da Cultura. Por “Cultura”, esse tipo de Psicologia entende um sistema de sinais, regras, símbolos e práticas que, de um lado estruturam o campo da ação humana e, de outro - estes mesmos sinais, regras e símbolos - são constantemente reconstruídos e transformados pela ação e a praxis humana.
Pode ser útil dividir a Psicologia da Religião em diversas vertentes e subsecções, fazendo notar que elas não são inteiramente independentes uma da outra, o que, no entanto, não é possível tratar adequadamente nesta palestra.
a) - Primeiro, é vital para o desenvolvimento da Psicologia como corpo de conhecimento, atitudes e habilidades, que a Psicologia Cultural investigue como a cultura se constitui, facilita e regula a subjetividade humana e sua expressão em diversas funções e processos psíquicos como esses são postulados pelas diferentes teorias e escolas (p. ex. percepção, memória, saúde mental, self, inconsciente). É importante notar que o conceito de cultura empregado aqui é dinâmico e não significa meramente “contexto” ou “situação”. Nas palavras de Ernst Boesch, um influente representante alemão da Psicologia Cultural contemporânea:
A cultura é um campo de ação que vai de objetos e produtos usados por seres humanos até instituições, ideias e mitos. Sendo um campo de ação, a cultura oferece possibilidades de e, do mesmo modo, estipula condições, para a ação. Circunscreve objetivos que podem ser atingidos por certos meios, mas também estabelece limites para ações corretas , possíveis e também desviantes. A relação entre os diferentes materiais bem como os conteúdos ideacionais do campo cultural de ação é sistêmica, isto é, as transformações em uma parte do sistema podem causar um impacto em outra parte. Como um campo de ação, cultura não somente inclui e controla as ações, mas é continuamente transformada por elas; portanto, cultura é mais um processo que uma estrutura. (BOESCH 1991: 29)
Com tal concepção, a Psicologia Cultural vai além da conceituação psicológica comum de cultura. Embora a Psicologia contemporânea reconheça que as interações humanas são influenciadas pela cultura e que também os sentimentos, pensamentos, experiências e comportamentos são modelados por ela, a Psicologia Cultural concebe tudo isto como inerentemente cultural, como sendo resultado do ser humano embebido na cultura e, por isso, considera ser a cultura um genuíno elemento de todo funcionamento humano psicologicamente relevante. É com esta forma de Psicologia Cultural que tenho a intenção de lidar nesta palestra.
Vejo, inicialmente, todas as condições e determinantes do funcionamento psíquico. Sejam elas limitativas (com isyo, quero me referir aos arranjos psicofísicos ou às condições sociais e geográficas), operacionais (como as atividades adquiridas ou aprendidas), ou normativas (como regras e normas), são, todas, sempre variáveis culturais e históricas (PEETERS 1994).
Esta variante da Psicologia Cultural se consiste, portanto, grosso modo, de duas formas: sincrônica uma e diacrônica a outra. Ambas admitem a realização da natureza histórica da cultura (nas suas várias manifestações) e do funcionamento psíquico humano.
Na primeira visão, a sincrônica, a ênfase recai sobre as funções e processos psíquicos de sujeitos contemporâneos, fazendo, assim, abstração da variação histórica. No entanto, na segunda, a diacrônica, as mudanças históricas no funcionamento psíquico humano são investigadas e explicadas com base nas modificações das condições e determinações culturais. A Psicologia Cultural é geralmente considerada como sendo uma aproximação multidisciplinar, algo entendido mais prontamente no caso da variante sincrônica. De fato, porém, nas duas formas aqui mencionadas de Psicologia Cultural, se entende que a Psicologia Cultural pode colaborar com as demais Ciências Sociais e Humanas. Em sua forma sincrônica, a Psicologia retransmite informações e eventualmente teorias, conceitos e habilidades provenientes, por exemplo, da Antropologia, da Sociologia e das Ciências Políticas. Em sua segunda modalidade, ela o faz com referência mais à Historiografia e, eventualmente, à Biologia Evolutiva, que estão entre os parceiros óbvios de suas teorizações e pesquisas.
b) - Numerosas publicações de uma segunda variante se devotaram tradicionalmente ao esforço de detectar e determinar o envolvimento humano em produtos culturais de variados tipos. Enquanto na primeira variante da Psicologia Cultural a cultura é entendida mais ou menos em seu sentido antropológico, isto é, em nível macro, nesta segunda variante ela é vista de um modo mais elitista e restritivo. A atenção é dada a produtos da alta cultura, como novelas, filmes, óperas e outras artes refinadas bem como, ainda, a empreitadas como guerra e paz, esportes, anúncios, organizações, assuntos internacionais e dimensões importantes como a socialização, a sexualidade, o namoro, o trabalho, a morte e o morrer.
Cada um desses assuntos é igualmente estudado por outras disciplinas acadêmicas para as quais a Psicologia pode servir de conhecimento auxiliar. Em campos e disciplinas acadêmicas como Estudos Culturais, Educação ou Artes, a Psicologia é frequentemente solicitada a explorar o envolvimento humano no fenômeno estudado. Nestes casos, o emprego da Psicanálise é típico. Nesta segunda variante da Psicologia Cultural é dada considerável atenção à variedade dos fenômenos religiosos, do que decorre uma substancial contribuição para a Psicologia da Religião. E mais, um grande número de grandes psicólogos, vindos particularmente da tradição psicanalítica, escreveram explicitamente sobre religião a partir de sua própria perspectiva psicológica (Freud, Jung, Erikson, Allport, Maslow, Fromm), mas outras aproximações psicológicas têm sido utilizadas com frequência por outros estudiosos para analisar os fenômenos psicológicos de fundo religioso (KRIPALL 1995; PFISTER 1910, 1926, 1944, 1948; SUNDÉN 1959, 1996)..Como presumo que o leitor esteja mais afinado com esta visão que com a anterior, não mais a levarei em conta aqui. Mais adiante, contudo, farei algumas observações pontuais sobre o papel especial da Psicanálise.
c) - Uma terceira variante da Psicologia Cultural será ainda lembrada, embora brevemente apenas. É comum encontrar, entre os psicólogos culturais, uma compreensão de que diferentes contextos, lugares e tempos produzem psicologias diferentes, resultantes do fato de terem se desenvolvido em sujeitos constituídos de modo psicologicamente distintos, o que mostra ser a história da Psicologia elaborada sobre elaborações socialmente geradas e não sobre fatos naturais (DANSIGER 1990, 1997).
É por isso que na Psicologia Cultural, por um lado, se dá atenção à assim chamada psicologia indígena: aquelas psicologias desenvolvidas por “pessoas comuns” dos dois lados do Atlântico (e não por psicólogos euroamericanos, que são os produtores de todo o atual conhecimento psicológico ‘acadêmico’) entre os dois lados do Atlântico (MUCH 1995).
Por outro lado, se dá na Psicologia Cultural a devida atenção à história da Psicologia enquanto empreendimento ocidental. Como se verá, nesta terceira variante encontramos uma colaboração com os especialistas em culturas locais (alguns deles academicamente treinados segundo moldes ocidentais, como os da Antropologia). Aparece, também, a colaboração com historiadores, especialmente com historiadores intelectuais ou com filósofos historicizantes (BELZEN 1991; LAUCKEN 1998; PARANJPE 1998).
Voltemo-nos, agora, para uma exploração mais minuciosa da primeira variante descrita acima, isto é, para a forma da Psicologia Cultural que se preocupa com a base cultural do funcionamento psíquico humano e é desenvolvida como uma parte integral da psicologia.
Para alguns psicólogos da cultura, que hoje trabalham a partir de uma compreensão mais multitonalizada e processual do impacto da cultura sobre o funcionamento psíquico, tal proceder amplia o alcance da teoria psicológica. Realmente, ao olhar para temas da Psicologia como a cognição, a emoção, a autoestima, o self, o bem-estar e a motivação, a Psicologia Cultural colaborou para a elaboração de uma nova moldura teórica. Um insight central da revolução cognitiva foi o que se deu quando, indo além das informações, os indivíduos perceberam o sentido de sua experiência, ao invés de meramente processá-la de modo passivo. Um ato de interpretação faz a mediação entre o estímulo e a resposta, recorrendo necessariamente a sistemas de significado culturalmente definidos. Contextos culturais distintos requerem diferentes atividades e levam a diferentes habilidades cognitivas. Por exemplo: descobriu-se que a solução de problemas matemáticos pode caminhar de modos diferentes, levando a diferentes resultados em diferentes situações. Lave; Murtaugh e La Rocha (1984) descobriram que enquanto 98% dos problemas eram corretamente resolvidos por sujeitos na mercearia, somente 59% de questões equivalentes eram resolvidas pelos mesmos sujeitos quando testados em uma sala de aula.
Estes pesquisadores argumentaram ainda que a solução de problemas não é uma atividade mental “desencarnada”, mas é específica do tipo de situação na qual o sujeito está envolvido. Em geral a cognição é vista como constituída em parte pelas atividades práticas e concretas nas quais está situada segundo as ferramentas culturais das quais ela dispõe. Igualmente, as emoções não são as mesmas, diferindo não somente em graus entre as culturas, mas também de acordo com as diferentes culturas, ou seja, há emoções que existem em algumas culturas e não em outras. As emoções são caracterizadas por crenças, julgamentos e desejos cujos conteúdos não são universais, mas determinados por sistemas de crenças, valores e costumes culturais de comunidades particulares. Não são respostas naturais eliciadas por fatores igualmente naturais dados por uma determinada situação, mas padrões sócio-culturalmente adquiridos e determinados de experiência e expressão que posteriormente se tornam traços característicos de certas situações sociais. (ARMON-JONES 1986).
Em concepções do self enquanto fruto da compreensão e experiência do funcionamento psíquico do próprio indivíduo existe uma diferença qualitativa com relação ao self concebido a partir dos modos interpessoais do mesmo funcionamento. Assim, entre indivíduos de comunidades culturais caracterizadas por significados individuais e os de comunidades com práticas relacionais, existem diferenças. Os pesquisadores Shweder; Bourne (1984), ao descrever e comparar os índios oriyan com os euroamericanos mostraram que, quando a ênfase é colocada na ação mais do que em traços abstratos, estes enfatizavam mais o contexto. Por exemplo: ao invés de definirem o amigo como amigável, diziam que ela ou ele “traz bolos para minha família em dias de festa”.
Recentes extensões deste tipo de pesquisa indicaram que a teoria da compreensão mental não evolui espontaneamente em direção a um ponto ou traço psicológico final, mas em direções que refletem as contrastantes concepções epistemológicas das comunidades culturais locais (LILLARD 1998; MILLER 2002).
Outro exemplo: a atribuição de erro fundamental (isto é, a parcialidade no exagerar a disposição em relação a explicação situacional do comportamento ) era no início presumida como sendo universal, mas as pesquisas sugerem que os asiáticos podem ser menos vulneráveis a isto que os norte-americanos (LEE; HALLANHAN; HERSOG 1996; MORRIS; NISBETT; PENG 1995).
Olhando para a questão da autoestima e do bem-estar, as pesquisas culturais mostram que estratégias de aumento da autopromoção defensiva para manter sentimentos positivos sobre o self variam de cultura para cultura. A população japonesa enfatiza uma instância autocrítica culturalmente sustentada e as populações chinesas enfatizam a manutenção da harmonia dentro dos grupos. As tendências da autoestima e da satisfação de vida são maiores entre os norte-americanos do que entre os asiáticos (DIENER E DIENER 1995) e, provavelmente, não deveriam ser vistas como indicativas de uma ligação entre bem-sucedidos padrões de adaptação e o individualismo.
Além disto, pesquisas nessa área mostram que medidas psicológicas de autoestima são influenciadas por concepções de normas, práticas e autoimagens como características individuais e, por isso, podem não atingir os objetivos centrais do self nas culturas que enfatizam o completo preenchimento de responsabilidades interpessoais e da interdependência (MILLER 2001, 33).
No que concerne à motivação, pesquisas culturais recentes desafiam a concepção que comumente liga motivação com o individualismo e mostram que o agente da motivação é qualitativamente diferente em comunidades culturais contrastantes. Em grupos culturais em que o self é visto como inerentemente social ao invés de autônomo, os indivíduos tendem a experimentar seu verdadeiro self na realização de expectativas sociais mais do que agindo autonomamente. Também, Miller e Bersoff (1994) mostraram que, enquanto os americanos interpretam a ajuda como sendo uma motivação mais endógena do que uma resposta a expectativas sociais, os indianos vêem a ajuda em ambos os casos como algo endogenamente motivado.
Igualmente, Iyengar e Lepper (1999) descobriram que as crianças euroamericanas mostram menos motivação intrínseca quando escolhem num anagrama ou jogo tarefas que foram desenvolvidas por suas mães ou por seus pares, mas que as crianças americano-asiáticas também mostram maiores níveis quando agem visando preencher as expectativas das pessoas em quem confiam. Estendendo este tipo de pesquisa cultural para questões de socialização, foi mostrado que não somente o significado, mas também as consequências adaptativas de modos particulares de socialização, são culturalmente dependentes. Nas comunidades euroamericanas os modos comunitários autoritários de parentesco tendem a se associar mais a comportamentos inadaptados do que os de pais menos controladores, concordando com o a visão coreana de que os pais são responsáveis por exercer autoridade sobre seus filhos; na Coréia, falhas em exercer esta autoridade são vistas como negligência (BERNDT; CHEUNG; LAU; HAU 1993).
Após esta revisão sumária de alguns resultados de pesquisas interculturais contemporâneas, voltemos a algumas teorias desenvolvidas e/ou usadas pela atual Psicologia Cultural que empregam uma variedade de conceitos e teorias, indicando assim tendências variadas de pensamento. Como o espaço aqui não permite sequer começar a desenhar este largo espectro, examinarei brevemente apenas duas destas tendências: a teoria do self dialógico e as aproximações narrativas, discutindo também as teorias de ação ou atividade.
A conduta humana, em contextos religiosos ou não-religiosos, é sempre preenchida por significados. Conduta significa algo, tanto para o ator quanto para os outros participantes da cultura. Este significado se enraíza tanto na história de vida pessoal quanto nos significados culturalmente disponíveis. Parte destes significados é inconsciente, não somente no sentido psicanalítico do termo, como também neste sentido. Antes de focalizar o significado pessoal e idiossincrático, a análise das atividades humanas deve levar em conta as formas de vida que contextualizam o significado. Esses significados culturalmente disponíveis podem ser analisados unicamente através de textos: palavras, provérbios, histórias, mitos e símbolos articulados.
Independentemente da verdade da afirmação de que a Psicologia Cultural está contando apenas a metade da história se não analisar a atividade/ação, é válido afirmar que o conhecimento cultural dos símbolos, conceitos e palavras armazenados e mantidos pelas convenções linguísticas, estimula e organiza os fenômenos psicológicos. Neste sentido, a narrativa psicológica pode ser uma grande aliada na análise da religiosidade, seja ela qual for. Com ela se enfatiza que, durante o curso de suas vidas, as pessoas escutam e assimilam histórias que as habilitam a desenvolver “esquemas” que dão direção à sua própria experiência e conduta, esquemas que as ajudam a poder então criar sentidos para potenciais sobrecargas de estímulos. Para cada história que vai se desenvolvendo e para cada situação as pessoas trazem um catálogo de tramas que são usadas para dar um sentido à história ou situação (MANCUSO; SARBIN 1983). Reside aqui a possibilidade de aplicar a psicologia narrativa aos fenômenos religiosos. Seja o que for para que a religião possa ser ou apontar além disto, ela é um reservatório de elementos verbais, histórias, interpretações, prescrições e comandos que, em seu poder de determinar a experiência e conduzir à sua legitimação, possui caráter narrativo. A definição de religião de Clifford Geertz, que é largamente aceita, no contexto da Psicologia Cultural, aponta para a importância central das “histórias”, da realidade linguisticamente transmitida e dada:
uma religião é um sistema de símbolos que funcionam para estabelecer poder,de longa e pervasiva duração e motivação nos homens ao formular concepções de ordenação geral da existência e ao tomar estas concepções com tal aura de factualidade que as disposições pareçam absolutamente realistas. (1973: 90)
Para efetivar a conexão entre o conceito acima dito e a narrativa psicológica é preciso somente tomar a palavra símbolo desta definição e dar a ela um conteúdo mais preciso com a ajuda de histórias e práticas. De forma associada, é bom perceber que tanto as práticas quanto as concepções empregam histórias para explicar-se e legitimar-se. Em outras palavras, pessoas que - entre as várias formas de vida culturalmente disponíveis - foram introduzidas em ou se apropriaram de uma forma religiosa de vida têm à sua disposição um sistema de interpretação e conduta que para eles prefiguram (narrativamente) a realidade. Então, em qualquer situação, expectativas, interpretações e ação podem ser trazidas para dar suporte àquilo que derivou de um horizonte religioso de compreensão e que, em certas circunstâncias, confirma e reforça esta compreensão. Na verdade, em tais pessoas e grupos considerados reverentes sucede com frequência que, espontânea e repetidamente, dá-se o fato de que eles ativam este horizonte religioso de compreensão e estão numa posição em que - a despeito dos paradoxos com os quais sejam confrontados – superam seus próprios problemas de interpretação religiosa e agem em harmonia com o sistema de interpretação e conduta dos quais se apropriaram assim como com as histórias que lhes haviam sido transmitidas.
Uma abordagem psicológica recente desenvolvida de acordo com tendências na Psicologia Cultural contemporânea é o conceito de “self dialógico” proposto por Hermans e Kempen (1993). Estes autores propuseram a ideia de um self com uma multiplicidade de posições do EU em uma paisagem imaginária. Aproximando-se da proposta de uma psicologia narrativa sugerida por Sarbin (1986), a qual assume que na narrativa do self um autor único está contando uma história sobre si mesmo como se fosse um ator, Hermans e Kempen concebem o self dialógico como polifônico. Um - ou o mesmo - indivíduo vive, ou pode viver, numa multiplicidade de mundos, com cada mundo tendo o seu ator contando uma história relativamente independente da história dos outros atores dos outros mundos. De vez em quando os atores podem mesmo entrar em diálogo. Além disso, o self dialógico pensado nos moldes de uma novela polifônica tem também a capacidade de integrar as noções das narrativas e diálogos imaginários. A ideia de self de Hermans e Kempen, em contraste com a de James e Mead, estipula um Eu em arco que organizaria os vários constituintes do mim. Ao invés disto, o caráter espacial do self leva à superposição de uma multiplicidade descentralizada de posições do EU que funcionam como autores relativamente independentes, cada um contando histórias sobre os seus respectivos MIM como atores (HERMANS; KEMPEN 1993). Em suas publicações iniciais sobre o self dialógico, os autores apontavam para três maneiras das quais suas concepções diferem das muitas existentes no Ocidente: a) - em contraste a concepção do self como individualista, o EU se move num espaço imaginário de uma posição para outra, de onde diferentes ou mesmo contraditórias visões do mundo são possíveis; b) - o self dialógico é social, o que não significa que um self continente individual entra em interações sociais com outra pessoa de fora, mas que outras pessoas ocupam posições neste self multivocal. A outra pessoa é a posição que o EU pode ocupar e que cria uma perspectiva alternativa no mundo (incluindo o self). Finalmente: c) a concepção de self dialógico se opõe ao ideal de self como estrutura de equilíbrio centralizado. Hermans e Kempen não estipulam o self como centro de controle: as diferentes posições do EU no self representam diferentes pontos de ancoragem que, dependendo da natureza da interação, podem organizar as outras posições do EU até um dado ponto no tempo (HERMANS; KEMPEN; VAN LOON 1992).
A teoria de ação é uma teoria seminal de Vigotsky. Ele enumera três fatores culturais que influenciam o funcionamento psíquico:
Vigotsky enfatizou a dependência do funcionamento psíquico destes três fatores e a dominância das atividades sobre os outros dois (VIGOTSKY 1998: 169-170). A estrutura das funções mentais mais elevadas representa um elenco de relações sociais entre as pessoas. Essas estruturas nada mais são que uma transferência de uma ordem social para dentro da pessoa e isto constitui a base da estrutura social da personalidade humana.
Outro membro da escola histórico-cultural na Psicologia que foi iniciada por Vigotsky escreve, de modo similar, que ”mudanças se dão no curso do desenvolvimento histórico no caráter geral da consciência dos homens que são engendradas por mudanças no seu modo de vida” (LEONTJEV 1981: 22).
De acordo com os teóricos de ação, atividades, artefatos e conceitos culturais precisam ser examinados por psicólogos com um olhar que se dirige à compreensão dos indivíduos numa dada cultura particular. Esta é uma tarefa que não pode ser confiada só a psicólogos, pois se deve procurar fora do indivíduo para compreender o modo de operação, o conteúdo e as dinâmicas dos fenômenos psicológicos constituídos por fatores e processos culturais.
Gerth e Mills (1953) mostraram que as ações são divididas em papéis e que cada papel acarreta direitos, responsabilidades, normas, oportunidades, limitações, recompensas e qualificações distintas.
A atividade da religião, por exemplo, inclui os papéis de crente e usualmente de alguns tipos de padre, ambos muito frequentemente divididos numa variedade de categorias religiosas (como o penitente, o possuído e o iluminado, ou tais como o pastor, o batizador, o ministro, o exorcista, etc.). A característica distintiva de um papel formata o funcionamento psíquico do ocupante, pois é realizando vários papéis que a pessoa incorpora certos objetivos e valores que incentivam e dirigem a conduta bem como os elementos da estrutura psíquica. Preencher um papel requer treinamento psíquico: envolve aprendizagem sobre o que fazer bem como o significado do que se faz. “Sua memória, seu senso de tempo e de espaço, sua percepção, seus motivos, sua concepção de self, seu funcionamento psicológico é formatado e estendido pela configuração específica de papeis que ele incorpora de sua sociedade” (GERTH; MILLS 1953: 11).
O conceito de papel (social) serve à visão da Psicologia da Religião na medida em que designa um conjunto específico de normas, direitos, responsabilidades e qualificações que pertencem não somente a pessoas e/ou situações reais no presente, mas também daquelas que procedem do setor de ação, das histórias religiosas, símbolos e discursos em geral. Papéis são específicos, maneiras diferenciadas de agir e reagir, e o conceito pode ser usado para designar o funcionamento (ação mas também atitudes, emoções e expectativas correspondentes) da parte da pessoa real que crê bem como da parte da conduta prevista/antecipada dos seres do setor imaterial definidos/estabelecidos pelas diversas tradições religiosas, como o psicólogo da religião sueco Hjalmar Sundén (1959-1966) indicou. Sua teoria dos papéis da experiência religiosa provou ser uma ferramenta heurística poderosa para analisar casos históricos e contemporâneos, e pode ser considerada uma grande contribuição para a Psicologia Cultural da Religião (BELZEN 1995-1996).
Mencionei inicialmente que uma parte substancial da Psicologia da Religião foi formatada em linhas psicanalíticas. Por mais interessante que isto possa parecer, a maioria desses trabalhos não é compatível com a Psicologia Cultural tomada em sentido estrito, já que o processo psicanalítico se presume universal e universalmente válido. Pesquisas que comprovam e desaprovam tal pressuposto são bem conhecidas. Servem como exemplos para exageros da Psicanálise, por exemplo ao sugerir que entidades supraindividuais, como sociedades e/ou culturas inteiras, repetem fases e mecanismos psicanalíticos (BADCOCK 1980) são igualmente bem conhecidos.
No entanto, em minha opinião, nada disto desqualifica a psicanálise como um importante campo de teoria e insights para a Psicologia Cultural. No geral, a Psicanálise é como qualquer psicologia que foca na pessoa e toma uma perspectiva dupla. Em ambas, a força da moldagem da cultura e a história biográfica individual que modela o funcionamento psíquico do indivíduo são levados em conta.
As reflexões psicanalíticas oferecem importantes contribuições focando nas experiências mais precoces da criança e nos relembrando de que a subjetividade, em todas as suas manifestações, também e inevitavelmente carrega as marcas de momentos vulneráveis na história de vida individual, da tensão dinâmica implicando na possibilidade de falhas que podem mais tarde, de modo extremo, vir a expressar as mais diversas formas de patologia. Com respeito a qualquer ato e experiência, portanto, se pode e se deve atingir a questão concernente ao lugar que estes ocupam na história do indivíduo. Por isto Freud define o significado de um processo psíquico como a intenção para a qual ele serve e sua posição na continuidade psíquica Para a maior parte de nossas pesquisas, podemos substituir por sentido a palavra intenção ou propósito (1917-1971: 40), ou seja, substituir por termos que se conectam a uma intencionalidade.
Além disto, em alguns círculos psicanalíticos há uma consciência do impacto da cultura que corre na via contrária das razões psicanalíticas comuns. Por exemplo, analistas estruturalmente informados enfatizam a importância do que Lacan chamou de ordem simbólica ou discurso do Outro (discours de l’Autre). Aqui, o desenvolvimento psíquico é resultado da cultura, não é crescimento natural – no sentido de ser inato – de acordo com Lacan.
A estrutura da psiquê (não somente os seus conteúdos variáveis culturalmente), como tal, é dependente da cultura, de forças vindas de fora (é a mãe quem deve apresentar o mundo à criança).
Portanto, como Freud definiu pulsão como trabalho por causa da intrínseca unidade com o corpóreo, a cultura também impõe trabalho e dá forma ao campo psíquico. Na PR alguns autores, mais notadamente o belga Antoine Vergote, aplicou tal perspectiva com excelentes resultados (VERGOTE 1978, 1997, 2002). Como espero que o leitor esteja familiarizado com essa perspectiva, não lidei com ela nesta palestra, a qual vejo como compatível como um suplemento necessário à Psicologia Cultural, e só menciono isto de passagem.
A Psicologia Cultural parece bem preparada para corrigir um dos mais antigos e mais largamente difundidos defeitos da Psicologia da Religião: o de se esquecer de focar, ao menos de certo modo, a religião enquanto fenômeno da cultura. A Psicologia Cultural pode funcionar aqui como remédio, na medida em que nos capacita a considerar de maneira justa o impacto cultural do fenômeno em consideração, pois ela leva em conta a maneira específica de vida (Wittgenstein) na qual os sujeitos estão envolvidos. Asseguro que, se fizer isso, ela tomará consciência de que seus resultados não são válidos para qualquer pessoa de qualquer religião, um tipo de aspiração que, aliás, deveria ser abolido da Psicologia em geral e não só da que se dedica ao estudo da religião.
Não há esta coisa chamada “religião em geral”. O que existe são formas específicas de vida que levam ao mesmo rótulo “religioso”. A Psicologia, enquanto tal, não deveria se empenhar em buscar insights em direção a elementos presumivelmente básicos do funcionamento psíquico válidos para todos os sujeitos sem levar em conta o tempo e o espaço de cada um. A Psicologia da Religião, mais especificamente, deveria tentar detectar como uma forma específica de vida religiosa constitui, envolve e regula o funcionamento psíquico de seus adeptos.
A Psicologia da Religião terá um futuro e terá possibilidade de buscar resultados e interpretações significativos selecionando fenômenos específicos das formas de vida religiosa, levando em conta o impacto psíquico particular delas e usando conceitos e métodos da teoria psicológica cultural.
De modo análogo, a Psicologia Cultural promete ser uma valiosa contribuição e um corretivo para outras aproximações psicológicas que já focam a religião como um fenômeno cultural, mas tentam extrapolar para conclusões não-científicas a que nunca deveriam chegar. Um interessante exemplo é a atenção crescente para as bases neurológicas e cognitivas do funcionamento religioso (ANDRESSEN 2001). Resultados deste tipo de pesquisa têm sido usados tanto de modo reducionista quanto apologético (BADCOCK, 1980; NEWBERG; D`AQUILI; RAUSE 2001). Autores desta abordagem enfatizam ou o cérebro ou a mente em suas explicações sobre religião.
No entanto, e não estou fazendo justiça à literatura referente a este tópico (para uma visão introdutória, veja-se Reich (2004), as pessoas parecem esquecer que mesmo estas são pré-condições necessárias para o específico do funcionamento humano e, elas mesmas, não são suficientes por si só. Mesmo se descobrirmos que algumas partes do cérebro são mais vitais para o funcionamento psíquico que outras (RAMACHANDRAN; BLAKESLEE 1998), nós não poderemos ainda concluir que tais partes sejam responsáveis pelo fenômeno religioso.
O impacto da aculturação sempre permanece e este é um dos pontos principais para a abordagem psicocultural, particularmente quando se trata de aplicá-la à religião. Igualmente, se há evidências de que a religião se desenvolveu para propósitos evolutivos (BOYER 2001; GUTHRIE 1993), ainda assim fica para os psicólogos a tarefa de descobrir por que meios uma religião qualquer molda a vida religiosa de seus membros.
Também, quando as Ciências Cognitivas mostram que in religione a mente funciona como foi predeterminada a fazer, não seria esta afirmação um tanto trivial? Como poderíamos nós, após cerca de cem anos de pesquisa, cogitar algo diferente? Claro que a mente levará em consideração somente algumas ideias e práticas religiosas, facilitará as coisas para as mesmas e atrapalhará as demais; e é claro que o conhecimento científico sobre o trabalho da mente deve ser levado em conta para uma teoria compreensiva da religião (para a qual a totalidade da Psicologia da Religião será capaz de contribuir de maneira apenas modesta). O que sempre permanecerá impossível é a habilidade de elas julgarem os valores existenciais e ontológicos últimos de qualquer tipo de religião com base no conhecimento científico. Além do fato de que de o conhecimento científico ser provisório por natureza, nenhuma ciência pode em princípio atacar a ou transformar-se em instrumento apologético de qualquer religião.
Nessa linha, o cérebro e a mente estarem envolvidos no funcionamento religioso é algo elementar; que eles sozinhos determinem a forma, conteúdo e modalidade do funcionamento religioso individual ou da religião como um fenômeno cultural é uma conclusão insana. Mas a psicologia cognitiva e a aproximação neurobiológica podem ajudar a avaliar e podem juntar-se à Psicologia Cultural para detectar e retratar, através da análise do entrelaçamento entre religião e funcionamento psíquico, o que é específico para formas religiosas de vida.
Deveríamos tomar cuidado para não cair mais uma vez no debate natureza x educação: obviamente, em todo funcionamento humano mente e cérebro estão envolvidos e capacitam, modelam e limitam o que o ser humano pode e não pode fazer. Mas eles não determinam tudo e todas as coisas. Se nós queremos conhecer mais sobre um fenômeno cultural como a religião, a Psicologia Cultural é um modo legítimo de tentar descobrir mais sobre a relação entre a religião e funcionamento psíquico.
Diferentes visões psicológicas podem ser empregadas para tentar analisar pessoas e fenômenos religiosos. Embora algumas possam ser mais aptas que outras, cada uma delas deve permanecer modesta: cada uma oferecerá uma perspectiva parcial do fenômeno em consideração. Deste modo e em seu próprio direito, as diferentes aproximações psicológicas à religião farão aquilo que seu nome requer de fato: usar o instrumento da psicologia para descobrir mais sobre religião, um dos mais complexos fenômenos das culturas humanas.
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