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11. Os Serviços Multidisciplinares na Clínica Psicológica "Ana Maria Poppovic" - Yara Spadini Vicini, Rosa Maria Farah e Colaboradores dos Serviços
O presente documento foi elaborado pelos profissionais responsáveis pelos Serviços da Clínica Psicológica da PUC-SP, com a finalidade de levantar subsídios que possam fundamentar e estimular o aprofundamento da discussão sobre a natureza, objetivos, funções, atribuições, operacionalização, integração e inserção dos Serviços Multidisciplinares numa Clínica-Escola.
Será apresentada inicialmente uma síntese das reflexões já realizadas pelo grupo a respeito das questões motivadoras desta iniciativa, e, em seguida, uma descrição de cada um dos Serviços, descrição essa que será acrescida das observações sobre as peculiaridades e necessidades observadas em cada sub grupo.
Ao trazer estas informações ao conhecimento da Chefia - bem como dos demais colegas de trabalho da Clínica - é intenção do grupo promover a criação de condições que favoreçam a maior integração do trabalho do corpo de profissionais da Clínica, como um todo.
INTRODUÇÃO
Sem perder de vista seu objetivo precípuo - o ensino na área de atendimento clínico - a Clínica Psicológica "Ana Maria Poppovic" apresenta atualmente um perfil claramente delineado de organização que integra ensino/pesquisa/extensão, exercendo importante função social num momento em que as políticas de assistência pública e privada se encontram altamente defasadas no atendimento das necessidades da população.
A Clínica oferece hoje campo de aprendizado a cerca de 400 estagiários dos cursos de graduação, pós-graduação, especialização e aprimoramento em Psicologia e Psicopedagogia e graduandos em Serviço Social e Fonoaudiologia. Passam pela triagem uma média anual de 1500 clientes e cerca de 500 recebem atendimento regular, num fluxo diário médio de 80 pessoas.
São elas crianças, jovens e adultos, que recebem cuidados psicoterapêuticos individuais ou grupais, em diferentes modalidades, além dos atendimentos oferecidos pelos Serviços de Fonoaudiologia, Grupos Temáticos de Pais, Neurologia, Psicopedagogia, Psicoterapia de Deficientes Visuais, Psiquiatria, Serviço de Informática, Serviço Social e Triagem.
Ampliando o estrito atendimento psicoterapêutico, e a partir dele, a Clínica constitui-se hoje numa organização que atende a uma demanda multifacetada de problemas, exigindo de seus profissionais e estagiários de todas as disciplinas uma atenção especial, diversificada e integrada, que dê conta das atuais exigências psico-sociais de sua clientela.
O perfil dessa população caracteriza-se por uma maioria de pessoas de média e baixa renda, incluindo professores, funcionários e alunos da comunidade acadêmica, que buscam atendimento psicológico gratuito ou a preços acessíveis.
Na grande maioria dos casos, verificam-se problemas interligados. São eles de ordem econômica, ou de conflitos relacionais e familiares, problemas de escolaridade, de inserção de jovens e adolescentes no convívio social ou no mercado de trabalho, de uso de drogas, etc, e situações diagnosticadas como problemas fonoaudiológicos, neurológicos, psiquiátricos, psicopedagógicos, deficiência visual, excepcionalidade, entre outros.
Por essas características e, tratando-se a Clínica de uma organização de portas abertas ao atendimento público, ela difere significativamente de um conjunto de consultórios privados, em sua natureza, na sua estrutura de funcionamento, na abordagem e no encaminhamento dos clientes, exigindo de seus profissionais respostas criativas e eficientes para o trato dessas diferenças.
Nesta especificidade de atendimento, inserem-se os Serviços da Clínica. Mais do que trabalhos complementares ou de suporte técnico ao tratamento psicológico, os Serviços e essa especificidade se integram, em direção a um objetivo comum que é o atendimento eficaz da população que nos procura e a capacitação de alunos e supervisores no aprofundamento teórico-operativo da nossa ação profissional. Os serviços constituem-se em áreas de atividades clínicas diferenciadas, capazes de compreender a realidade através de uma abordagem psico-física-social regular e continuada.
NATUREZA E CARACTERIZAÇÃO DOS SERVIÇOS
Repensando a natureza dos Serviços no âmbito de uma Clínica-Escola, eles podem ser considerados como mediações entre as necessidades acadêmicas de aprofundamento científico e prestação de serviços e a demanda da população e da comunidade universitária. Ou seja: através da execução fundamentada e aprimorada dos Serviços, podem ser criadas e recriadas as bases teóricas e metodológicas intermediárias entre o conhecimento adquirido academicamente e a realidade com a qual nos deparamos no cotidiano.
Usando uma metáfora, podemos dizer que os Serviços atuam nos interstícios da instituição, formando uma espécie de “tecido conjuntivo” entre as diferentes modalidades de atendimento oferecidas pelas propostas curriculares.
É inerente aos Serviços seu caráter de permanência e de continuidade, diferente do atendimento psicológico que se institui e se encerra na relação estrita supervisor/estagiário/cliente. Deste tipo de ocorrência podemos citar como exemplo os núcleos de formação profissional, que podem existir ou não num determinado semestre letivo, dependendo da inserção de alunos no mesmo.
Exige-se dos Serviços constante revisão de suas ações e instauração de recursos pessoais e materiais permanentes que lhes possibilitem: a execução regular e continuada do atendimento aos clientes; a realização de estudos institucionais específicos de cada área, oferecendo à Clínica as propostas de estruturas adequadas e eficientes; aprofundamento teórico (e pesquisas de campo) na forma de ações que propiciem aos seus estagiários elementos disciplinares, multidisciplinares e interdisciplinares atualizados, essenciais para sua formação.
DESCRIÇÃO SUCINTA DOS SERVIÇOS
Dada a especificidade de cada um dos Serviços, não é desejável que eles se enquadrem numa estrutura única de funcionamento e de inserção de seus profissionais e estagiários. Mas é imprescindível, para o desenvolvimento dos Serviços, que eles sejam reconhecidos pelo conjunto da Clínica, e que sejam discutidas e concretizadas as necessidades básicas para seu bom funcionamento.
Queremos iniciar esta discussão a partir das considerações acima e da descrição que será apresentada a seguir, dos objetivos, justificativas, organização, atividades e necessidades atuais de cada um dos Serviços da Clínica relacionados abaixo.
1. Grupo temático de pais: Uma Abordagem Interdisciplinar
2. Psiquiatria
3. Serviço Social
4. Psicopedagogia
5. Fonoaudiologia
6. Psicoterapia de Deficientes Visuais
7. Neurologia
8. Triagem e Plantão
9. NPPI – Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática
DESCRIÇÃO DOS SERVIÇOS MULTIDISCIPLINARES DA CLÍNICA PSICOLÓGICA "ANA MARIA POPPOVIC"
1. GRUPO TEMÁTICO DE PAIS: Uma Abordagem Interdisciplinar
Profissionais responsáveis: Mirel Granatovicz, Yara Spadini Vicini
COMPOSIÇÃO ATUAL DA EQUIPE:
Psicóloga
Mirel Granatovicz
Assistentes Sociais
Yara Spadini Vicini
Maristela Gasbarro
Rosalina de Santa Cruz Leite
Assistentes Sociais Colaboradores
Mário Shozo Yama
Daniela dos Santos Reis
Aprimorandos de Psicologia no 1º sem/2000
Ana Carolina P. Seligmann
Angela de Nazaré Santana Elia
Anna Paula Nunes Umeki
Cintia Mazzoni
Flávia Scavone Maria Aparecida Leite
Aprimorandos de Psicologia no 2º sem/2000
Adriana Mellone
Marta Serra Young
Tânia Debora Barbosa
Estagiários do Serviço Social
Alexandra Zavatini
Carla Yamamora
Jair Alves Soraia Chedid
Vanessa Aparecida Pereira
Fernanda A. de Oliveira
OBJETIVOS DO SERVIÇO
1. Levar o aprimorando/estagiário a vivenciar uma experiência de atendimento, reflexão e elaboração junto a um Grupo de Pais, em equipe, com professores, estagiários e aprimorandos de diversas áreas numa abordagem interdisciplinar, tendo a Clínica como campo privilegiado de ação integrada de Ensino, Pesquisa e Prestação de Serviço.
2. Oferecer aos pais um espaço para troca de conhecimentos, informações sobre temas centrais que os preocupam, vivências, visando mais a aceitação deles próprios como pessoas descentralizando o foco inicial dos filhos para sua própria valorização, sem culpas.
3. Dar ênfase à função preventiva e educativa da Clínica junto à comunidade.
4. Promover o ensino e a prática, com supervisão do trabalho interdisciplinar.
JUSTIFICATIVA
Para atender às demandas complexas de saúde mentais, cada vez mais exige-se da Clínica maior intercâmbio entre as especialidades. Surgiu a idéia de realizarmos uma pesquisa-ação interdisciplinar, da qual resultou o trabalho como grupos de pais.
Os Grupos de Pais constituem-se num tipo de atividade que possibilita a ampliação dos recursos da Psicologia para além dos muros do trabalho psicoterapêutico, oferecendo seus serviços e conhecimentos a parcelas mais abrangentes da população, na direção de uma ação coletivamente preventiva, que pode ser realizada nas mais diferentes modalidades do trabalho grupal. E permite ao Serviço Social criar mediações teórico-práticas entre as análises mais genéricas da questão social em nosso tempo e nossa sociedade, e suas expressões concretas no cotidiano das pessoas que solicitam alívio.
ORGANIZAÇÃO ATUAL DO SERVIÇO
Os integrantes do Grupo Temático de Pais constituem-se a partir:
1. Da procura de pais ou cuidadores em geral, por recursos que auxiliem ou solucionam as dificuldades de suas crianças;
2. Do encaminhamento feito por escolas, clínicas médicas, outras clínicas psicológicas, hospitais da rede pública ou não, familiares e vizinhos que já usufruem ou usufruíram dos Serviços da Clínica;
3. Do encaminhamento dos Setores de Recursos Humanos da PUC-SP, dando assistência aos componentes da comunidade puquiana (professores e funcionários e seus familiares);
4. Do encaminhamento feito por professores de Núcleos da Graduação da Faculdade de Psicologia;
5. Do encaminhamento dos demais Serviços da Clínica.
Por tratar-se de uma Clínica-Escola, estagiários e colaboradores de Serviço Social e aprimorandos de psicologia inserem-se integradamente, constituindo uma equipe que atende, com supervisão, e se aperfeiçoa teoricamente entrando em contato com princípios referentes às fundamentações teóricas básicas abordadas no Serviço (teorias sobre família, saúde mental, rede social, equipe reflexiva, psicologia do desenvolvimento, interdisciplinaridade, entre outras).
ATIVIDADES EM DESENVOLVIMENTO NO MOMENTO
1. Grupos de Recepção no início do semestre.
2. Grupos Temáticos de Pais propriamente ditos, 2 grupos por semestre, um dirigido a pais de crianças e outro dirigido a pais de adolescentes.
3. Realizam-se 6 encontros quinzenais em cada grupo.
4. Reuniões quinzenais da equipe do Serviço para o preparo das reuniões de Grupo, discussão teórica e avaliação das Reuniões Temáticas, junto à avaliação do desempenho dos integrantes da Equipe.
5. Participação em Seminários, Encontros, divulgando o Serviço.
6. Elaboração de Relatórios
RECURSOS DE QUE DISPÕE O SERVIÇO PARA DESENVOLVER SEU TRABALHO
A maior parte dos trabalhos do Serviço está sendo realizada no Prédio Velho da PUC-SP, em duas salas reservadas para o atendimento concomitante dos dois Grupos Temáticos de Pais, e em uma sala destinada à Reunião da Equipe do Serviço (faltam, na Clínica, espaços adequados).
Utilizamos vídeos cuja aparelhagem é cedida pelo Setor de Audio-Visual da Universidade e gravador de som para registro das reuniões e eventualmente filmadora da Clínica.
2. PSIQUIATRIA
Profissional responsável: Prof. Dr. Máximo Lamberto Stephano
COMPOSIÇÃO ATUAL DA EQUIPE:
Apenas uma pessoa, o próprio profissional responsável.
OBJETIVOS DO SERVIÇO
O Serviço dá suporte aos clientes da Clínica que apresentam problemas psiquiátricos, basicamente casos de depressão, disritimia, esquizofrenia, distúrbios bipolares, transtorno de personalidade, ansiedade e pânico.
Trata-se de diagnóstico diferencial oferecido a adultos e crianças, desde que encaminhado pela triagem ou pelo psicoterapeuta responsável.
Oferece ainda eventuais pareceres para diagnósticos de clientes e situação funcional daqueles que trabalham na Universidade.
JUSTIFICATIVA
Ao comparecer para a entrevista de triagem, seja individual ou grupal, o cliente poderá apresentar sintomas que indiquem doenças e problemas psiquiátricos, cuja atenção e diagnóstico requeiram os serviços complementares que a Clínica oferece. Nesses casos, o cliente é atendido, concomitantemente, por uma modalidade de atendimento psicoterápico e também pelo serviço de psiquiatria desde que encaminhado pela Equipe da Triagem. A Equipe de Triagem, muitas vezes, se depara com emergência e situações de crise, que (nestes casos) o profissional da psiquiatria orienta o encaminhamento, quase sempre para Hospital-dia que estão em “rede” com a Clínica.
Porém, a maior demanda posta para este serviço refere-se à necessidade de apoio e suporte ao tratamento psicoterápico. Ou seja ele é disponibilizado aos pacientes que estão em tratamento ou aos que se encontram no processo de triagem e que apresentam problemas que requeiram um diagnóstico diferencial. Até porque, tanto o terapeuta quanto a equipe de triagem muitas vezes precisam do parecer do psiquiatra para decidir a respeito da elegibilidade ou não da solicitação do cliente e da continuidade do tratamento face aos critérios pré-estabelecidos dos serviços oferecidos.
Ressalta ainda que o serviço é bastante utilizado e que já foi ampliado os horários para atender à demanda da Clínica.
ORGANIZAÇÃO ATUAL DO SERVIÇO
A demanda para o serviço de psiquiatria tem aumentado, hoje o profissional atende três dias na semana, de terça a quinta, e tem atendido somente aqueles pacientes que são encaminhados pela triagem e demais profissionais. Jamais se atende alguém que venha diretamente da rua para a Clínica. Assim, o serviço opera no limite do suporte e do complemento às demais modalidades de atendimento da Clínica. Basicamente atua na sintomatologia apresentada pelo paciente, visando eliminar os sintomas que revelam óbices ao tratamento. Todavia, na agenda deste profissional, tem sido possível encaixar as discussões de caso. Hoje, estagiários, professores e profissionais da Clínica discutem os casos com relativa facilidade de acesso ao profissional responsável, seja para discussão de casos ou para supervisão. Conforme indica este coordenador responsável pelo serviço, - basta que se tenha a “pasta do paciente” nas mãos e se combine um horário, preferencialmente entre 12h e 12h30min.
ATIVIDADES EM DESENVOLVIMENTO NO MOMENTO
Como já foi indicado, as doenças e problemas psiquiátricos em grande parte exigem atendimento em ambulatório. Entretanto as atividades têm se resumido ao trabalho de consultório. Embora não se deseje criar ambulatório, é necessário consolidar um posicionamento da Clínica na rede de atendimento em saúde mental. Os pacientes que necessitam de atendimento em ambulatório e nos casos extremos de internação, tem sido encaminhados para o hospital-dia que geograficamente está mais próximo da Clínica – no caso o hospital-dia da Pompéia.
RECURSOS DE QUE DISPÕE O SERVIÇO PARA DESENVOLVER SEU TRABALHO
O serviço, como foi apontado, conta apenas com o profissional responsável, que atende na “sala” de triagem. É um atendimento de consultório, que devido à falta de equipamento ambulatorial, assenta-se na maior parte, na ação de atendimento em detrimento ou em prejuízo da assistência e cuidado que inúmeras doenças requerem. Portanto, tem sido difícil a assistência, embora o serviço vise o “atender e o assistir” como partes necessárias integrantes da atenção qualificada, a Clínica necessita de uma “terceirização” mais efetiva que possa suportar uma boa examinação. Por exemplo, as disfunções, discrazias, convulsões e outras quase sempre requerem diagnóstico diferencial, impossível de se chegar devido às limitações e recurso existentes.
OUTROS INFORMES E/OU COMENTÁRIOS
Um dos pontos que merecem destaque, dos diversos já delineados relativos ao serviço de psiquiatria, são os que se referem à importância dos serviços de ambulatório e laboratório, e que facilitam o caminho para se chegar ao diagnóstico diferencial, (termo que designa o objetivo primordial da psiquiatria no contexto da Clínica Psicológica). Contudo, se não cabe no propósito da Clínica fazer ambulatório, é necessário otimizar a comunicação em rede. Assim, constata-se que a Clínica vive as seguintes situações:
1. Vê-se que as dificuldades na comunicação e de acesso à rede, (da qual todos reclamam: pacientes, profissionais, estagiários, professores ou funcionários da Clínica) indicam que a inserção da Clínica é insuficiente senão inexistente.
2. Pôr a Clínica em rede passa pela elaboração de um programa de comunicação integrada, que pressupões a informatização da Clínica, (sem confundir com os objetivos do Núcleo de Pesquisas de Psicologia aplicada à informática) na perspectiva de um intercâmbio (interativo) com os serviços, entidades, equipamentos, hospitais, entidades e instituições de apoio que compõe o campo de apoio e serviços de saúde mental.
3. Esta interação passa pela comunicação, produção e distribuição de boletins, folhetos, e impressos que orientam a população a lidar com as doenças e problemas verificados na sintomatologia psiquiátrica.
4. Seja na versão eletrônica ou impressa, é necessário que se divulgue os dados e análises produzidos a partir do diálogo inter-disciplinar e multi-profissional em torno de casos individuais, grupais ou comunitários.
continuação...