Mera
Vista Point
Contexto
atacado
de idéias
A
linha do trem separa dois lados. A moeda tem dois lados. O mundo
tem dois lados. Quantos? Mas o mundo e a moeda são redondos. Quantos
lados tem uma coisa redonda? Onde e quando são os lados da moeda
e do mundo? A linha do trem - traça linha. Separa. Interrompe. Cria
e recria lados. Quantas linhas há num redondo? Quantas linhas há
na moeda e no mundo? Quantos lados? O trem não pára. A moeda não
para. O mundo não pára. O trem, a moeda e o mundo do Brás, no meio
de seus lados. Lado a lado. As coisas pequenas se movem sozinhas,
as linhas. E assim movem-se os lados. Da moeda e do mundo.
Projeto
distribuição
A
partir da linha do trem, andando em seus arredores na altura do
largo da Concórdia, pretendemos encontrar e documentar o cotidiano
e o trabalho dos camelôs que ali se encontram.
Encontrar,
conversar. Documentar. O que eles vendem? Por que vendem isso e
não aquilo? Como vendem e pra quem? Quando? E quando chove muito?
E quando não vendem muito ou não vendem nada? Como fazem? E se vendem
muito? Documentar seus produtos, suas estratégias de venda, e de
compra. De onde vem estes produtos? Quem os faz e por que? E quem
compra, faz o que com eles? Pretendemos a partir dos produtos, identificar
cerca de seis camelôs e documentar seu trabalho, seu cotidiano e
suas histórias.
Na
feira de ambulantes do Largo da Concórdia, escolheremos produtos
que nos pareçam à princípio difíceis de vender e que ainda assim
se repitam freqüentemente nos pontos de venda. Produtos kitsches
de plástico colorido, coisas, coisinhas mesmo, vagabundas, baratas,
feias, frágeis, coisas que pareçam não prestar para nada direito,
que não servem para nada especificamente. Escolheremos estas "coisas"
- talvez sejam elas cor de rosa, talvez precisem de pilha ou tenham
salto alto, talvez tenham cheiro e efeitos colaterais, talvez curem,
talvez distraiam. Serão "coisas" que aparentem nada de
útil ou sólido à primeira vista, mas que ainda assim se repitam
na paisagem barroca de barbies, bambis e havaianas do Largo da Concórdia
- prova esta que estes produtos se repetem, se reproduzem, se massificam
e se integram na cidade. Procuraremos produtos que só se ache no
Largo da Concórdia, ou talvez produtos que se achem em outros largos
da concórdia similares da cidade. Escolheremos seis produtos.
A
estratégia de escolhermos o ponto de partida no produto e não no
camelô se deve ao fato de que estamos interessados na relação destes
objetos com estas pessoas. Como estes objetos influenciam, determinam
a vida destas pessoas. O que são exatamente estes objetos e quem
são estas pessoas? De onde vem e por que? E como passaram a vender
aqueles objetos ou aquelas coisas. O trabalho que propomos se apoia
nisto.
Traçar
uma linha, como o trem, a partir do produto, no caminho de sua produção
e de sua distribuição. De um lado, quem o produz, aonde e por que?
E quanto dinheiro se movimenta ali? O Intermediário, se existe,
o camelô. O caminho do produto, daquela "coisa", e do
dinheiro que ela movimenta na vida das pessoas em cujas mãos ela
passa. O trem, a linha do trem documentada em vídeo materializará
a idéia do percurso. Do outro lado, quem compra o produto e o leva
pra casa. Pra onde e por que? Pra que aquela coisa agora? Quanto
custou aquilo e quantas vezes aquela pessoa ganha este valor por
mês? E no meio de tudo, o camelô, que vive daquilo, provavelmente
sem saber porque. Como ele vende. Como ele vive e o que ele compra.
E quanto dinheiro sobra?
Pretendemos
traçar um retrato coletivo, um esboço (um esforça) sobre a economia
informal, sobre sua força criativa, sobre seu papel de resistência
face à economia globalizante. Quem se salva? Quem pode o que? Como
uma grande parte da população vive desse mercado e como ele se relaciona,
se integra na cidade. O mecanismo e o movimento. O volume e a velocidade,
vistos a partir do produto posto à venda.
Vídeo
Varejo
O
vídeo se desenvolve no plano de documentação visual, aberta, poética.
Pretendemos registrar imagens não esperadas, contraditórias, complexas,
relacionadas umas com as outras, da linha do trem e de seus arredores;
do Largo da Concórdia e de seus camelôs; das "coisas"
à venda nos tabuleiros e no chão; de seus preços, ofertas e especulações;
de suas estórias e caminhos: de onde vem e pra onde vão. E por quanto?
Entre imagens livres, rápidas de close, de quase abstração-formal
dos objetos vendidos e de panoramas aéreos da linha do trem e do
Largo da Concórdia. E por outro lado, entrevistas, diálogos que
documentem, posicionem os números e as histórias das "coisas"
apresentadas no vídeo. As "coisas" tem sua própria linguagem.
As "coisas" criam sua própria linguagem. O vídeo é a tradução.
Instalação
mercadoria
exposta
Dos
materiais. Das coisas. Partindo ainda das "coisas" e das
situações nas quais elas se distribuem - na feira - no Largo da
Concórdia, pretendemos reconstruir uma "atmosfera" de
mercado na área de exposição. Uma instalação com lonas de plásticos,
tabuleiros e logicamente, com as "coisas" diretamente
expostas em grande número. Acompanhando-as vem suas histórias, registradas,
traduzidas em projeções de vídeo. A instalação deve recriar a atmosfera
de mercado onde os vídeos tornam segredos e mecanismos comerciais
visíveis. O trem circula nas imagens como o pequeno troco circula
de mão em mão. O pequeno troco ajuda o mundo a girar. Um emaranhado
de becos e ambientes de lona plástica e pouca luz, nas quais se
encontram "coisas" que recriam histórias as quais se vê
em quatro grandes projeções de vídeo. Um mercado que visualiza seus
ritos.
Todo mercado é um labirinto de possibilidades.
Maurício
Dias
Walter
Riedweg
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