Maurício Dias e Walter Riedweg vão fazer um mapeamento desse espaço
denso e aparentemente opaco. Mas não se trata de um mapa urbano
convencional, que indique a localização das edificações e equipamentos,
as diferentes formas de ocupação e atividades. Isso não importa
ali, onde a ocupação informal dilui todas as distinções e fronteiras.
Na impossibilidade de traçar os contornos deste mundo fluído a partir
de elementos fixos, eles trabalham com o que circula: os produtos
vendidos pelos camelôs.
Quais são esses produtos? Como são fabricados
e obtidos? Quem os vende e compra? Como circulam? Trata-se de retraçar
o roteiro destes produtos, como um anel de trocas numa ilha polinésia.
Os múltiplos circuitos que vão se entrelaçando, em variação contínua.
Estes percursos não fazem contorno, não estabelecem fronteiras.
Eles engendram uma configuração movente, radicalmente desprovida
de forma estrutural. Uma arquitetura e um urbanismo liqüefeitos
que só podem ser enfocados através de seu ritmo.
Vídeos de curta duração, como spots publicitários,
foram gravados com cerca de uma dezena de camelôs, anunciando seus
produtos e falando de suas vidas. Esses vídeos serão apresentados
nas próprias barracas de cada um, recobertas por lonas estampadas
com suas fotografias. No centro do largo, uma pequena construção,
de dois andares, servirá ao mesmo tempo de centro de emissão de
imagens, ponto de encontro e mirante.
Instala-se
um dispositivo paralelo ao circuito dominante da publicidade e da
comunicação, do universo do consumo e da imagem que baliza a inserção
social. A identidade e a história destes agentes, excluídos da economia
formal e das outras instâncias da cidadania, encontram seu canal
de manifestação. A rede de difusão dos vídeos marca a presença de
cada um dos camelôs, numa espécie de cartografia da ocupação da
área.
A intervenção de Maurício Dias e Walter Riedweg
não visa impor um programa, mas seguir a linha, o movimento. Desenhar
a carta da mecânica dos fluídos da área. A trama de relações que
se arma no lugar, no entanto invisível através de referências puramente
topológicas, como o edificado e o desenho urbano. Uma curiosa sobreposição
de níveis de abstração, o comércio informal e a difusão televisiva,
apontando para outras modalidades de integração metropolitana.
Poderiam
a ocupação e o comércio informais, apesar de seus perversos efeitos
na economia legal e na conservação da paisagem urbana, sugerir outras
configurações, mais flexíveis e dinâmicas, para estes vastos espaços
intersticiais, as zonas que se espiram no centro das metrópoles?
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