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Em defesa da vida
Isabella S. Alberto
 

Reportagem sobre o encontro com Daniel Serrão, especialista em Bioética da Universidade do Porto. A defesa da dignidade da vida humana desde seu primeiro instante. Matéria publicada originalmente em Passos Litterae Communionis nº 26, janeiro/fevereiro de 2002

O Núcleo Fé e Cultura, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, realizou no último dia 6 de dezembro a palestra “Manipulação da vida: certo ou errado?”, com o professor Daniel Serrão, da Universidade do Porto (Portugal). Além de catedrático, o professor é também médico e membro do Comitê Diretor de Bioética do Conselho da Europa e da Academia Pontifícia para a Vida, do Vaticano.

Professor Serrão iniciou a palestra apresentando-se como “católico que procura discernir no mundo os sinais da misteriosa presença de Deus” e “médico patologista que dedica-se a estudos sobre a vida humana”.

Serrão defende a vida como o manifestar-se de duas realidades igualmente importantes: corpo e espírito. “A relação entre corpo e espírito é misteriosa e enigmática. Cada ser humano é único e irrepetível. O corpo humano só é corpo humano porque nele se expressa o espírito humano, e o espírito humano só é espírito humano porque nele se expressa o corpo humano”.

Por meio dos avanços da ciência comprova-se hoje que a vida é matéria, energia e informação, e é o modo como se jogam estes três elementos que faz a vida animal ou vegetal. A vida humana é um caso particular que manifesta-se neste corpo material. “O progresso da genética nos permite afirmar que cada ser humana é único e irrepetível”.

A partir do momento que o espermatozóide fecunda o óvulo já se estabeleceu uma nova vida, e a primeira coisa a formar-se é a identidade genética, o genoma. As informações chegam das duas metades, feminina e masculina, e todas as diferenças (alto ou baixo, loiro ou moreno, etc.), são resultados das combinações genéticas, isto é, da expressão do genoma. Sendo assim, este novo ser que vai se desenvolvendo ao longo dos nove meses de gestação recebe somente energia por parte da mãe, todo o resto já está pronto. Por isso, já é vida, e o homem não tem o direito de eliminar uma coisa dada, gratuita, que não é obra de suas mãos.

A palestra se desenvolveu em torno de três provocações que depois fizeram emergir importantes questões nos ouvintes: quando começa a vida humana? Será legítimo destruir uma vida humana? Será legítimo manipular uma vida humana?

Na primeira questão, Serrão nos ensina que biologicamente não podemos saber quando começa uma vida humana, isto é, quando se constitui a identidade genética. Uma vida humana tem um programa porque está identificado e guardado no genoma. Poucos minutos após a fecundação, constituem-se os 46 cromossomas e, ali, dá-se o início da vida. “Isto é verdade científica.” Depois cada homem se desenvolve e se diferencia pelas combinações genéticas e pelas influências que recebe do ambiente, pois o meio exterior à célula também exerce influência sobre a informação do DNA. Um esquimó é biologicamente resistente para viver numa casa de gelo, já um brasileiro, não.

Como católico e cientista, Serrão afirmou categoricamente a ilegitimidade de destruir uma vida humana, mesmo no seu estado inicial, como embrião, defendendo que não existe nenhuma diferença entre o valor do embrião e o de um homem formado, pois trata-se sempre de uma vida humana. “Todo o jogo da renovação da vida passa através da sobrevivência. Todo corpo tem direito à sobrevivência. É um direito biológico. Quem destrói uma vida humana ofende a própria dignidade biológica do ser humano.”

Sobre a manipulação, o professor defende a ciência em favor da vida. Sendo assim, manipulações podem ser aceitáveis quando são para um bem. “Toda pesquisa que não destrua é legítima. [...] A descoberta da estrutura do DNA foi um dos passos mais brilhantes da ciência”, afirma Serrão. Assim, a manipulação pode ser legítima e aceitável desde que não ameace a vida humana. Se, para buscar curas, for preciso realizar pesquisas que destroem embriões, isto não será aceitável no plano ético.

Atualmente, segundo Serrão, podemos observar algumas formas de manipulação que são incoerentes com a vida humana:

1) Pílula do dia seguinte - substância hormonal que impede o transporte do embrião, que já é a primeira apresentação do corpo humano, ao longo da trompa. O embrião, com 4 a 6 horas de vida, começa a produzir uma proteína que é seu primeiro sinal para a reação do organismo, e a pílula impede a chegada dessa mensagem;

2) Aborto – é inaceitável, pois, se não é legítimo biológica e eticamente destruir o embrião, ainda mais o feto. Serrão afirma que, mesmo em caso de doenças genéticas, a negação do sofrimento não pode ser justificativa para destruição de uma vida que já existe;

3) Clonagem – banalizando, podemos dizer que o processo de clonagem consiste em experiências nas quais se retira o núcleo de uma célula diferenciada e se repete o processo de crescimento, retornando assim ao seu estado embrional. Serrão afirma que não há nenhuma comprovação, nenhuma experiência real de que seja possível qualquer influência genética sobre o genoma, e que, apesar de todos os recursos gastos em pesquisas, ainda não foi possível uma clonagem humana. Se algum dia conseguirem realizá-la, afirma ele, evidentemente não será um ser humano normal.

O professor conclui dizendo que o que defende é a proteção da dignidade humana. Neste sentido, “João Paulo II é o mestre do meu dia”.

 
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