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O paradoxo de Michael Jackson
Artigo publicado no jornal eletrônico Ilsussidiario.net
Lorenzo Albacete

Lorenzo Albacete é editorialista do suplemento dominical do New York Times, assessor teológico das arquidioceses de Boston e Washington e da Conferência Episcopal Norte-Americana. Foi professor de teologia no Seminário S. José de Nova York e do Instituto João Paulo II nos Estados Unidos.


Na sociedade dita pós-moderna, a pessoa tem a ilusão de poder se auto-construir, superando ou integrando, segundo a própria vontade, as contradições e as dificuldades da realidade. O drama de Michel Jackson, de certa forma, mostra os limites dessa proposta de auto-construção.


Na semana seguinte a 25 de junho último, aparentemente não existia nada mais importante para a mídia norte-americana que a morte de Michael Jackson. Para aqueles que, como eu, não viam nele nada mais que um músico talentoso, mesmo que um pouco estranho, olhar para a televisão na semana passada foi como descobrir um outro planeta. Depois, com a notícia do golpe de Estado em Honduras, parecia que a mídia iria parar de explorar a vida privada de Jackson para ocupar-se de alguma outra cosia que estava acontecendo no mundo. Mas, com as notícias sobre os funerais, a jacksonmania voltou rapidamente.
Michael Jackson era um superstar global, como bem demonstram as reações no mundo inteiro por sua morte. Porém, creio que as reações aqui nos Estados Unidos são um pouco diferente daquelas de outros países. Segundo a revista Newsweek,  "Jackson escolheu – de modo calculado - refazer a si mesmo como um sonho americano de inocência e desejo de ser amado”. Na realidade, Jackson “era essencialmente um desse ‘produtos genuinamente americanos’ que, como ele escrevia William Carlos Williams, em 1923, acabam endoidecendo".
A juventude pós-moderna americana tem uma vida difícil tentando afirmar sua pós-modernidade. Porque o problema da vida é transformar a realidade, e não simplesmente tentar fugir dela com um relativismo cínico e absolutista. Basta pensar de quantos modos a realidade impacta a vida americana. A realidade das raças, do fideismo protestante, das questões de gênero, da oposição entre o forte senso de família e a exaltação do individualismo e do sucesso econômico. O sonho americano é de, ao mesmo tempo, manter e prescindir de tudo isso. O único modo para fazer isto é criar um “eu” que é ao mesmo tempo todas estas coisas. Michael Jackson era o ícone deste projeto: ao mesmo tempo vítima e executor, branco e preto, profundamente religioso e laicista, macho e fêmea, pai e egoisticamente livre de qualquer compromisso, pobre e ultra-rico... Tudo ao mesmo tempo.
Quem era o verdadeiro Michael Jackson? Alguma coisa dele mesmo permaneceu dentro deste estranho ser humano que, ao mesmo tempo, construiu e sofreu a própria transformação em um ícone pós-moderno americano? Para nós que acreditamos em Cristo, o verdadeiro Michael Jackson não poderá nunca ser destruído e o confiamos à misericórdia de Deus. E, em frente a Jackson, ícone de um deus pós-moderno americano, nós pedimos por aqueles que ainda estão procurando o verdadeiro Um.

 
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