O TRABALHO GRUPAL: VISLUMBRANDO NOVOS OLHARES/FAZERES NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO
01/2015
O TRABALHO GRUPAL: VISLUMBRANDO NOVOS OLHARES/FAZERES NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO
Bruna de Souza Diógenes*
Os achados da literatura apontam para um crescente aumento no número de encaminhamentos, por parte de escolas e centros de saúde, para o atendimento fonoaudiológico de alunos com problemas no problema de alfabetização. (GIRARDELI et al., 2012).
Como forma de transformar essa prática, atuando no campo da educação, o projeto “A Alfabetização e seus Avatares” se propôs a constituir um grupo de professores, tendo como pilar o trabalho em rede como propulsor de novas práticas, novos saberes e fazeres. A intersecção das redes – sujeito, escola e profissionais da saúde – poderia romper sentidos e produzir novas significações sobre o aluno e sobre o próprio professor.
Nesse sentido essa coluna discorrera sobre a concepção de grupo, destacando suas características e princípios norteadores. De acordo com Lane (1986), grupo é um:
[...] processo “natural” e “universal”, reproduzindo a ideologia dominante que define papéis grupais em termos de complementaridade, de produtividade e de coesão, sem que a instituição que os engendra nem suas determinantes históricas sejam consideradas na análise (p.92-93).
Pereira e Zanella (2001) apontam as principais características do grupo:
[...] forma uma nova entidade, com leis e mecanismos próprios; garante, além de uma identidade própria, as identidades específicas; preserva a comunicação; garante espaço, tempo e regras que normatizam a atividade proposta; organiza-se em função de seus membros e esses organizam-se em função do grupo; apresenta duas forças contraditórias, uma tendente à coesão e outra à desintegração; apresenta interação afetiva e distribui posições de modo hierárquico (p.106).
Sendo assim, o grupo revela-se no caráter coletivo. Sua construção implica ações que sejam realizadas pela coletividade, nas quais os resultados configuram-se pelos processos interacionais, nos quais os sujeitos significam seus pares e a si mesmos. Considera-se também a singularidade de cada membro do grupo que foi inicialmente, o que despertou o desejo de atribuir novos sentidos, a partir dos encontros, das histórias, dos acontecimentos e dos desejos.
Outro ponto fundamental ao falarmos de um grupo, é que o mesmo permite o surgimento de uma rede de relações. A troca de experiências e de vivências trazem imbricados os sentimentos e angústias entre cada indivíduo que o compõe. Ele possibilita a construção coletiva de determinado conhecimentos através da troca de diferentes modos de enxergar a realidade. Por meio das discussões, as pessoas se permitem avaliar e repensar os seus comportamentos, opiniões e pensamentos, conhecendo e compreendendo melhor suas relações com o entorno.
Esses sentidos compartilhados refletem a imprevisibilidade do grupo, tendo em vista que ele é ativo e depende do engajamento de todos os participantes, num movimento de escura das diversidades, semelhanças, afetamentos e discordâncias. Portanto, o contato entre a pluralidade de sujeitos, possibilita um movimento particular do grupo que ganha forma e materializa-se de diferentes maneiras, ora na pluralidade, ora na singularidade da coletividade que o constitui.
Parindo dessas discussões e entendendo a escola como sendo um dos espaços sociais da criança, sabemos que o modo como ela absorve as concepções impostas pela sociedade, interfere na forma como ela significa e enfrenta as dificuldades do seu aluno.
Para a construção do grupo de professores o projeto fez parceria com três escolas públicas de São Paulo. Desse convite surgiu uma vertente de trabalho que se dedicou a ouvir os dizeres dos professores sobre a sua prática e sua forma de enfrentamento das vicissitudes da escolarização.
O grupo de professores sustentou-se na realização de reuniões semanais, com a duração de 1 hora. Participaram desta pesquisa sete professores da educação básica, sob a coordenação de três pesquisadores (2 fonoaudiólogas e 1 psicóloga).
O grupo ao longo da sua trajetória se deparou com alguns percalços, muitos deles persistentes até hoje, como por exemplo, a ausência de alguns professores nos encontros e/ou idas esporádica de alguns deles nos encontros; as dificuldades destes em se constituírem como interlocutores; problemas relacionados à interação; a dificuldade no reconhecimento de alguns aspectos relacionados ao processo de alfabetização.
Apesar das dificuldades enfrentadas pelo grupo podemos apontar algumas mudanças, efeitos produzidos com o trabalho grupal, a saber: Muitos dos professores já se constituíram interlocutores no grupo de trabalho; construção de novos olhares lançados ao processo de alfabetização e aos alunos; maior entendimento do que constitui a relação ensino-aprendizagem; engajamento dos professores nas discussões mostrando-se envolvidos no processo, através de algumas propostas de temas e seu posicionamento diante do que esta sendo colocado; construção de confiança no grupo; professores se sentem parceiros nas questões trazidas e colaboram entre si; transformações nas ideias dos professores envolvidos, quanto aos sentidos dados à escola regular, bem como o reconhecimento da importância desse processo para o desenvolvimento da criança.
Ao final da pesquisa conseguimos observar que o trabalho realizado com o grupo de professores foi propulsor de novas práticas, novos saberes e fazeres. A inserção desses profissionais em um espaço de discussão aliado às vivências no contexto escolar pode romper com sentidos e significações cristalizadas dos sujeitos, produzindo novas formas de concebê-los. As mudanças nas queixas escolares tornaram-se possíveis quando novos sentidos foram dados a fala do sujeito, ao próprio sujeito, ao processo de aprendizagem modificando, assim, os efeitos da atuação desses profissionais em suas respectivas instituições de ensino e provocando nestes o desejo em relação à pesquisa na área em que atuam.
Referências bibliográficas
GIRARDELI, G.S. et al. Atendimento em fonoaudiologia: estudo de uma clínica-escola na cidade de Curitiba, Paraná. Revista Brasileira de Ciências da Saúde, ano 10, nº 34, out/dez 2012.
LANE, S. T. M. O processo grupal. In: CODO, W.; LANE, S. T. M. (Orgs). Psicologia social: o homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 1986b, p.78-98.
PEREIRA, R. S; ZANELLA, A. V. Constituir-se enquanto grupo: a ação de sujeitos na produção do coletivo. Estud Psicol. Natal, v.6,n.1, p.105-114,jan / jun. 2001.
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